JURISPRUDÊNCIA: contratação temporária com base em lei autorizativa afasta a improbidade administrativa

A contratação de servidores sem concurso público, quando realizada com base em lei municipal autorizadora, descaracteriza o ato de improbidade administrativa, em razão da ausência de dolo genérico do gestor público.

Essa é uma tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça que consolidou, em sua farta jurisprudência, a impossibilidade do gestor público ser acoimado por ato de improbidade administrativa.

A contratação temporária de servidores e sua prorrogação sem concurso público amparadas em legislação local não traduz ato de improbidade administrativa, mesmo quando a norma de regência for inconstitucional. Os atos fundamentados em lei local não caracterizam o dolo genérico, essencial para os casos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11 da Lei n. 8.429/1992).

Sobre o tema pacífica e vasta é a jurisprudencia do STJ:

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATAÇÃO IRREGULAR DE SERVIDORES POR TEMPO DETERMINADO. AUSÊNCIA DE NECESSIDADE EXCEPCIONAL RECONHECIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DOLO GENÉRICO. EXISTÊNCIA. REVISÃO DE MATÉRIA FÁTICA. INTERPRETAÇÃO DE LEI LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 7/STJ E 280/STF.
1. Trata-se de ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público estadual de Mato Grosso em face do agravante, ex-Prefeito do Município de Alto Garças/MT, em decorrência de contratação temporária de servidores, sem concurso público, fora das hipóteses constitucionais admitidas.
2. Na forma da jurisprudência do STJ, em linha de princípio, a contratação de servidores sem concurso público, quando realizada com base em lei municipal autorizadora, pode descaracterizar o ato de improbidade administrativa, em razão da ausência de dolo genérico do gestor. Precedente: AgInt no REsp 1.555.070/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 24/03/2017). 3. (…)
4. Agravo interno não provido.” (AgInt no REsp 1655151/MT, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 02/02/2018)

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO PARA CARGO EM COMISSÃO DE ASSESSOR JURÍDICO COM AMPARO EM LEIS MUNICIPAIS. DOLO GENÉRICO AFASTADO. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA.
I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.
II – A contratação de servidor sem concurso público, fundamentada na previsão em lei municipal, ainda que considerada inconstitucional pelo acórdão recorrido, afasta o dolo genérico exigido para a configuração do ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública.
III – De acordo com a exposição fática contida no acórdão recorrido, a legislação municipal é anterior à contratação em questão, ou seja, já existia no mundo jurídico, não se podendo atribuir a má-fé especificamente ao Agravado.
IV – O Agravante não apresenta, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida.
V – Agravo Interno improvido.” (AgInt no REsp 1555070/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 24/03/2017)

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR SEM CONCURSO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282/STF E 356/STF. SUPOSTA PRÁTICA DE ATO VIOLADOR DE PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ARTIGO 11 DA LEI 8429/92. AUSÊNCIA DE ELEMENTO SUBJETIVO EXIGIDO PARA A QUALIFICAÇÃO DA CONDUTA ENQUANTO ATO DE IMPROBIDADE. TRIBUNAL DE ORIGEM QUE CONSIGNA A EXISTÊNCIA DE LEI MUNICIPAL AUTORIZATIVA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N. 7/STJ E 280/STF.
1. A hipótese dos autos diz respeito ao ajuizamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, sob o argumento de que o então prefeito do Município de Capitólio teria realizado a contratação de servidores sem a realização de concurso público.
2. O prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados, entretanto, é imprescindível que no aresto recorrido a questão tenha sido discutida e decidida fundamentadamente, sob pena de não preenchimento do requisito do prequestionamento, indispensável para o conhecimento do recurso. Incidência das Súmulas 282/STF e 356/STF.
3. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é a ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Assim, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92 é indispensável, para a caracterização de improbidade, que o agente tenha agido dolosamente e, ao menos, culposamente, nas hipóteses do artigo 10.
4. Os atos de improbidade administrativa descritos no artigo 11 da Lei nº 8429/92 dependem da presença do dolo genérico, mas dispensam a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou enriquecimento ilícito do agente.
5. Esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que fica afastada a caracterização do dolo genérico, quando a conduta do agente público, mesmo que de questionável validade em razão da vigência dos preceitos constitucionais relativos à obrigatoriedade do concurso e excepcionalidade da contratação temporária, se deu com base em leis municipais que estavam em vigor quando da contratação dos servidores, posto que tais leis gozam de presunção de constitucionalidade.
6. Nesse sentido: AgRg no REsp 1358567/MG, 1ª Turma, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 09/06/2015; EAREsp 184.923/SP, 1ª Seção, Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/ Acórdão Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 05/03/2015; REsp 1231150/MG, 2ª Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 12/04/2012; AgRg no AgRg no REsp 1191095/SP, 2ª Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 25/11/2011.
7. No presente caso, pela leitura do acórdão recorrido, extrai-se que o Tribunal de origem, com base no conjunto fático e probatório constante dos autos, afastou o dolo consignando não evidenciadas as condutas ímprobas do agente, que agiu com respaldo em legislação vigente. Ora, a verificação acerca da existência do dolo demanda, no caso específico, a análise de lei local e dos elementos fático-probatórios dos autos, o que é inviável em recurso especial, ante as orientações contidas nas Súmulas 280/STF, por analogia, e Súmula 7/STJ.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.” (REsp 1348175/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/09/2015, DJe 28/09/2015)

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE INEXISTENTES. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DE VIGILANTE SEM CONCURSO PÚBLICO, COM FUNDAMENTO EM LEI LOCAL. AUSÊNCIA DE DOLO GENÉRICO. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF.
1. Nos termos do art. 535 do CPC, os embargos de declaração são cabíveis para a modificação do julgado que se apresentar omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente na decisão, o que de fato não ocorreu.
2. A contratação ou manutenção de servidores públicos sem a realização de concurso devido viola os princípios que regem a Administração Pública. Todavia, o caso dos autos mostra-se como uma exceção à regra, uma vez que a jurisprudência desta Corte já decidiu, em situação semelhante, qual seja, de nomeação de servidores por período temporário com arrimo em legislação local, não se traduz, por si só, em ato de improbidade administrativa.
3. A prorrogação da contratação temporária, com fundamento em lei municipal que estava em vigor quando da contratação – gozando tal lei de presunção de constitucionalidade – descaracteriza o elemento subjetivo doloso. Precedentes: REsp 1.231.150/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13.3.2012, DJe 12.4.2012; AgRg no Ag 1.324.212/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28.9.2010, DJe 13.10.2010.
4. Não cabe ao STJ, mesmo com a finalidade de prequestionamento, a análise de dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF.
Embargos de declaração rejeitados.” (EDcl no AgRg no AgRg no AREsp 166.766/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 30/10/2012)

Salientamos, por último, que esse entendimento do STJ é sufragado por ambas as turmas (1ª e 2ª) que são as encarregadas de julgar as matérias sobre improbidade administrativa na Corte Superior.

Por Josembergues Melo

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