Mesmo aprovadas, contas de convênio prestadas com atraso configuram improbidade para o TRF3

A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF3) condenou o ex-prefeito de Cássia dos Coqueiros (SP), João dos Reis Almeida Silva, por atos de improbidade administrativa na execução do Convênio nº 254/1998, celebrado com o Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto, órgão sucedido pelo Ministério dos Esportes, para construção e equipamento de ginásio esportivo no município. Para os magistrados, o político prestou de forma tardia as contas do convênio e geriu de forma temerária os recursos públicos.

Conforme explicou a Relatora do processo, Desembargadora Federal Diva Malerbi, a Lei nº 8.429/92 considera ato de improbidade administrativa, que atenta contra os princípios da administração pública, deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo.

Ela destacou que há bastante tempo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou o entendimento de que a configuração do ato de improbidade administrativa consistente em violação dos princípios da administração pública prescinde de comprovação de enriquecimento ilícito ou de prejuízo ao erário. A lesividade, nesses casos, é presumida, sendo necessária, porém, a demonstração do dolo, explicou.

Segundo a Magistrada, a prestação de contas pública fora do tempo caracteriza improbidade administrativa, caso o agente responsável tenha agido com dolo. Destacou que, à época dos fatos, o réu era Prefeito Municipal, responsável pela guarda e destinação do recurso financeiro oriundo do convênio abastecido com verba federal. Portanto, a prestação de contas deveria ser realizada conforme previsto no artigo 70, parágrafo único, da Constituição da República, e no artigo 1º, caput e parágrafo único, da Lei 8.443/92.

De acordo com as informações do processo, ficou comprovado que, em 16.09.1999, foi concedido prazo de trinta dias para que o então Prefeito apresentasse a prestação de contas. Contudo, somente em 26.12.2001, após cerca de dois anos e três meses, houve a exibição das contas referentes ao exercício de 1999, que em princípio não foram aprovadas.

“O réu, em suas defesas ao longo do processo, não justificou em nenhum momento a apresentação demasiada tardia das contas, mesmo à vista de prazo concedido. Por sinal, no seu recurso de apelação, chegou a transcrever trecho da sentença, que apontou que sua conduta não revelaria má-fé, mas sim ‘falta de competência administrativa’”, ressaltou.

Segundo Diva Malerbi, a justificativa apresentada não é aceitável para prestação de contas, uma vez que esta é um dever imposto pela lei e pela Constituição.

“Considerada a natureza do cargo confiado – de Chefe do Poder Executivo – ao réu não era lícito alegar desconhecimento da norma ou, mesmo, invocar a seu favor inaptidão em relação às suas responsabilidades”, afirmou.

Por isso, para a Magistrada, diante das explicações e das provas apresentadas, não havia como concordar com a tese da defesa, no sentido da inexistência de dolo ou má-fé, pois o réu deixou de prestar contas mesmo tendo plena consciência do dever legal.

A Relatora acrescentou que o STJ já decidiu que, no campo da improbidade administrativa, a atuação deliberada em desrespeito às normas legais, cujo desconhecimento é inescusável, evidencia a presença de dolo, sendo descabido cogitar-se de aplicação do princípio da insignificância.

Já em relação à parte que condenou o réu pelo atraso da obra, a relatora afirmou que o próprio TCU, ao analisar os desdobramentos finais do convênio, concluiu que, mesmo com atraso, a construção atendeu às finalidades estipuladas. Com isso, a desembargadora aplicou uma parte da tese da defesa do político, que sustentou que há jurisprudência formada no sentido de que a Lei de Improbidade Administrativa deve punir o administrador desonesto, e não o inábil.

“De se ressaltar que o TCU, conquanto verificasse que a obra fora concluída com atraso, não afastou a irregularidade na prestação de contas. Daí que, especificamente em relação a esse exagerado atraso na conclusão da obra, sendo incontestável que decorreu de má-gestão e não por corrupção, tanto que acabou finalizada a contento, sem que houvesse desvios de recursos públicos, aplicável a jurisprudência invocada pelo réu, no sentido de que a Lei de Improbidade Administrativa tende a punir o administrador desonesto, e não o inábil, razão pela qual, no ponto, fica afastada a configuração de improbidade.”

Segundo a Desembargadora, também ficaram configurados os danos morais coletivos, pois em decorrência da má gestão do ex-prefeito, a comunidade experimentou grande sentimento de insatisfação pelo atraso de cerca de dez anos na construção do estádio poliesportivo. Isso privou uma geração de cidadãos de direitos constitucionais como lazer, esportes e educação.

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Apelação Cível 0009061-38.2010.4.03.6102

Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região Autor: Assessoria de Comunicação Social
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