CONSULTA TCE-PE: Critérios para a acumulação legal de cargos públicos para os profissionais de saúde

Em 08.08.2018 foi formulada ao Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco a seguinte indagação pela prefeitura de Floresta:

“Existe impedimento de se contratar um médico em dois contratos distintos, um como plantonista e o outro para atender em sua especialidade (por exemplo: obstetrícia, ginecologista, pediatra, etc.), respeitando a carga horária máxima de 60 (sessenta) horas? Além disso, por serem contratos distintos, os mesmos podem chegar ao teto municipal?”

Após manifestação da assessoria da presidência, o Pleno do TCE/PE, sob a relatoria do Conselheira Teresa Duere, proferiu a seguinte resposta:

“VISTOS, relatados e discutidos os autos do Processo TCE-PE no 1857199-2, ACORDAM, à unanimidade, os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, nos termos do voto da Relatora, que integra o presente Acórdão, CONSIDERANDO o disposto no artigo 2°, inciso XIV, da Lei Estadual n° 12.600/2004 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco);

CONSIDERANDO que a Consulta atende aos pressupos- tos de admissibilidade (artigos 197; 198, inciso IX; e 199, incisos I, II e III, todos do Regimento Interno deste Tribunal – Resolução TC no 15/2010),

Em CONHECER da presente Consulta, e, no mérito, RESPONDER ao Consulente nos termos a seguir:

I. De acordo com o artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal/1988, é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários: a de dois cargos de professor; a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; a de dois car- gos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas. (Jurisprudência: Processos TCE-PE nº 1406752-3 – Acórdão T.C. nº 1444/14 e TCE-PE nº 1302554-5 – Acórdão T.C. nº 897/13);

II. Respeitada a forma de acesso ao cargo/emprego/função pública, nos termos do artigo 37, incisos I, II e IX, da CF/88, não há, em princípio, impedimento de um médico possuir dois vínculos distintos com o serviço público. A acumulação autorizada pela CF/88 alcança toda a Administração Pública, seja no mesmo ente, seja em entes diferentes;

III. A compatibilidade de horários não deve ser entendida, apenas, como a ausência de choque entre as jornadas de trabalho, mas também deve ser possível, considerando-se a saúde física e mental do trabalhador, bem como a qualidade do serviço prestado e a produtividade. No caso de profissionais da área de saúde, a situação é mais delicada, pois envolve o risco de atendimentos ineficazes, com risco de vida aos pacientes submetidos a profissionais exaustos (Jurisprudência: Processos TCE-PE nº 1406752- 3 – Acórdão T.C. nº 1444/14 e TCE-PE nº 1302554-5 – Acórdão T.C. no 897/13);

IV. Os gestores públicos devem rejeitar acumulações de cargos efetivos, quando for evidente a impossibilidade física da acumulação de jornadas de trabalho (Jurisprudência: Processos TCE-PE nº 1406752-3 – Acórdão T.C. nº 1444/14 e TCE-PE nº 1302554-5 – Acórdão T.C. nº 897/13);

V. Nas situações jurídicas em que a CF autoriza a acumulação de cargos, o teto remuneratório é considerado em relação à remuneração de cada um deles, e não ao somatório do que recebido. (Supremo Tribunal Federal – STF; RE 612.975 e RE 602.043, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 27-4-2017, P, DJE de 8-9-2017, tema 377 e tema 384).” (TCE/PE – Pleno – Proc. TC nº 1857199-2 (Acórdão nº 0877/18), Rel. Cons. TERESA DUERE, sessão de 08.08.2018, publicado em 13.08.2018)

Acrescentamos ao tema outra importante consulta respondida pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco ao definir que o servidor exonerado por acúmulo ilegal de cargos públicos não tem direito à restituição das contribuições previdenciárias. Vejamos:

“VISTOS, relatados e discutidos os autos do Processo TCE-PE nº 1602505-2, ACORDAM, à unanimidade, os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, nos termos do voto do Relator, que integra o presente Acórdão, em RESPONDER ao consulente nos seguintes termos:

“Foram identificados por esta Egrégia Corte diversos casos de acumulação indevida de cargos. Para aqueles que terão que optar, as contribuições feitas ao RPPS do cargo que deixara de ocupar poderão ser restituídas aos servidores visto que seriam decorrentes de vínculo irregular?”

1 –   As contribuições previdenciárias feitas ao RPPS não poderão ser devolvidas ao titular do cargo que deixará de ser ocupado por motivo de acumulação indevida no serviço público, tendo em vista que tais contribuições possuem natureza tributária e, por imposição legal, são proibidas de qualquer destinação que não seja para o pagamento dos benefícios previdenciários, ressalvadas as despesas administrativas e as compensações financeiras entre os regimes previdenciários.

2 –   Se o servidor público contribuiu para o RPPS, ainda que anulado o ato de ingresso, faz ele jus à certificação das contribuições previdenciárias, para o fim de utilização junto ao RGPS ou ao RPPS.” (TCE/PE – Pleno – Proc. TC nº 1602505-2 (Acórdão nº 0016/18), Rel. Cons. Carlos Porto, sessão de 24.01.2018, publicado em 29.01.2018)

Por fim, destacamos que a questão da carga horária máxima de 60 horas semanais, inobstante ser pacífico no STJ e TCU esse limite, o STF ao divergir sobre a matéria, fez com que os demais tribunais se adequassem ao entendimento da Corte Suprema:

“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS REMUNERADOS. ÁREA DA SAÚDE. LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. REQUISITO ÚNICO. AFERIÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
1. A Primeira Seção desta Corte Superior tem reconhecido a impossibilidade de acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos privativos de profissionais da área de saúde quando a jornada de trabalho for superior a 60 horas semanais.
2. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, reiteradamente, posiciona-se “[…] no sentido de que a acumulação de cargos públicos de profissionais da área de saúde, prevista no art. 37, XVI, da CF/88, não se sujeita ao limite de 60 horas semanais previsto em norma infraconstitucional, pois inexiste tal requisito na Constituição Federal” (RE 1.094.802 AgR, Relator Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, julgado em 11/5/2018, DJe 24/5/2018).
3. Segundo a orientação da Corte Maior, o único requisito estabelecido para a acumulação é a compatibilidade de horários no exercício das funções, cujo cumprimento deverá ser aferido pela administração pública. Precedentes.
4. Adequação do entendimento desta Corte ao posicionamento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal sobre o tema.
5. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1746784/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/08/2018, DJe 30/08/2018)

Verifica-se, portanto, que o limitador de 60 horas semanais, por si só, não pode ser impedimento para acumulação de cargos públicos.

Por Josembergues Melo

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