Falta de apoio político à pretensa candidatura não revela grave discriminação pessoal autorizadora de desfiliação partidária

A mera negativa de espaço político em uma eleição não pode ser vista como grave discriminação pessoal.

Trata-se de ação de perda de mandato eletivo por desfiliação partidária, ajuizada por Walter Guedes da Silva, em desfavor de Adelson Euzébio dos Santos, vereador no município de Sirinhaém, e do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro.

O Desembargador Eleitoral Vladimir Souza Carvalho iniciou tratando da preliminar, suscitada pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro, de inconstitucionalidade da Resolução do Tribunal Superior Eleitoral no 22.610/2007, norma que consubstancia a demanda, ao argumento de que fere o princípio da independência de poderes, consagrado no art. 22 da Constituição, vez que somente a Casa Legislativa teria poderes para cassar mandato de seus membros. O desembargador explicou que a questão já foi levada à discussão da Corte Suprema, a qual entendeu de maneira diversa da ora defendida pelo partido demandado. Assim, considerou o tema superado, votando pela rejeição da preliminar.

Quanto à decadência, prejudicial de mérito também suscitada pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro, o relator esclareceu que o Movimento Democrático Brasileiro – MDB, partido pelo qual se elegeu o mandatário Adelson Euzébio dos Santos, teria o prazo de 30 (trinta) dias da desfiliação para ajuizar a ação, como não o fez, iniciou o prazo para o Ministério Público Eleitoral ou quem tenha interesse jurídico pra fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) dias subsequentes. Explicou, ainda, que a desfiliação ocorreu em 20 de março de 2018, e a propositura da ação ocorreu em 8 de maio de 2018, portanto dentro do trintídio reservado àqueles que, subsidiariamente, poderiam fazê-lo.

Em relação a preliminar de ilegitimidade do autor da demanda, ao argumento de que a vaga legislativa pertenceria à coligação formada no processo eleitoral, de maneira que seria legitimado o suplente da coligação, o Des. Vladimir Carvalho sustentou que é cediço que tal entendimento não prevalece na orientação jurisprudencial pátria, a qual reconhece que cabe ao partido político, a princípio, a propositura da ação de perda de cargo por desfiliação partidária sem justa causa. Pontuou, também, que o STF, no julgamento dos mandados de segurança no 30.260/DF e no 30.272/DF, “estabeleceu uma distinção fática, consubstanciada na origem da vaga em discussão, de maneira que fora feita distinção entre os casos de cadeiras deixadas por parlamentares, ordinariamente, quando seguem para exercer outras funções – situação em que prevalece a ordem de suplência dentro da coligação –, e, ao reverso, as hipóteses em que se tem tão só a situação do trânsfuga, que se desliga de seu partido, preservando-se no exercício do mandato. Na última hipótese, tem-se, sim, a celeuma sob o enfoque da fidelidade partidária”, caso dos presentes autos, em que a legitimação ativa subsidiária compete ao primeiro suplente do partido que elegeu o vereador. Com efeito, considerou que a legitimidade ativa ad causam seria de Walter Guedes da Silva, autor da demanda, rejeitando a preliminar.

Quanto ao mérito, o relator ressaltou que a controvérsia resume-se à hipótese de justa causa levantada pela defesa, quando disse que havia um ambiente hostil para o filiado, no seio de sua legenda, uma segregação proposital em seu desfavor, o que configuraria, em tese, grave discriminação política pessoal. Cotejando as informações e documentos dos autos, o relator concluiu que toda celeuma está assentada na negativa do partido em apoiar pretensa candidatura a deputado estadual, externada pelo filiado, ora demandado, motivação que foi corroborada por testemunhos tomados em audiência.

Continuou defendendo que a mera negativa de espaço político em uma eleição não pode ser vista como grave discriminação pessoal. Ressaltou que tampouco foram demonstrados, neste caso, a presença de alteração substancial ou desvio reiterado do programa partidário, de maneira que não se pode acolher que houve justo motivo, nos termos da legislação de regência, a autorizar a desfiliação de Adelson Euzébio dos Santos de seu partido original, com manutenção da função legislativa ora fustigada. Com isso, o relator julgou procedente o pedido deduzido na exordial e declarou a perda de mandato do vereador.

O tribunal acordou, por unanimidade em rejeitar as preliminares suscitadas e, no mérito, julgar procedente o pedido e declarar a perda de mandato do vereador, nos termos do voto do relator.

NOTA DO ESCRITÓRIO

Vejamos a ementa do acórdão mencionado na matéria acima:

“Eleições 2016. Ação de perda de mandato eletivo por desfiliação partidária. Conexão. Existência. Constitucionalidade da Resolução do Tribunal Superior Eleitoral 22.610, de 2007. Legitimidade ativa do primeiro suplente do partido político que elegeu o mandatário. Prejudicial de mérito. Decadência. Não reconhecimento. Justa causa para o desligamento partidário hostilizado. Legislação de regência. Grave discriminação pessoal. Ausência.
1. Reputam-se conexas ações que trazem mesmo pedido e causa de pedir, o que se identifica neste caso, quanto à presente ação e outra também proposta pelo Ministério Publico Eleitoral.
2. Não há se falar em inconstitucionalidade da Resolução do Tribunal Superior Eleitoral 22.610, de 2007, que disciplina a matéria em discussão, quando sobre o tema já se pronunciou a Corte Suprema pátria, afastando tal alegação, posicionamento acompanhado por aquele Tribunal especializado.
3. Caminha pacífica a orientação jurisprudencial, no sentido de que, nesta espécie, notadamente, compete à primeira suplência da legenda que elegeu o parlamentar desertor a legitimidade ativa subsidiária para a propositura da demanda competente e, não, à suplência da coligação formada durante o processo eleitoral.
4. Hipótese em que o autor ingressou com a ação de perda de mandato no segundo trintídio decorrido desde a comunicação de desfiliação do vereador à legenda pela qual se elegeu, não havendo se falar em decadência.
5. Constatada nos autos a ausência de justa causa, a teor da legislação de regência, para a desfiliação rechaçada, porquanto se depreende que a motivação do vereador, para desligar-se de sua agremiação original, residiu no fato da sigla partidária externar resistência à pretensão daquele em lançar candidatura a cargo eletivo no certame de 2016, sendo certo que a falta de apoio político a tal ensejo do filiado não revela grave discriminação pessoal, mas, sim, situação inerente ao cenário político que, eventualmente, venha a se instalar em âmbito interno partidário. Anote-se a ausência de demonstração, mediante episódios concretos, de postura discriminatória promovida pela legenda, em desfavor do trânsfuga.
6. Acolhida preliminar de conexão e rejeitadas as prefaciais de inconstitucionalidade do normativo antes referido e de ilegitimidade ativa ad causam, bem como a prejudicial de decadência.
7. Procedência da pretensão deduzida na exordial, com declaração de perda de mandato do parlamentar requerido.” (TRE/PE – PET nº 0600243-82, Ac. de 25/03/2019, Relator Desembargador Eleitoral Vladimir Souza Carvalho)

Fonte: Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco Autor: Informativo TRE-PE nº 3/2019
Comentários