TRF3 majora condenação de advogado que reteve processo por crime contra a Administração da Justiça

A Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em decisão unânime, manteve sentença da 1ª Vara Federal de Tupã/SP que condenou um advogado por retirar processo judicial em nome de sua mãe e não devolver dentro do prazo legal. O objetivo era favorecê-la, parte em ação penal, com a prescrição punitiva, já que ela estava prestes a completar 70 anos.

O colegiado também atendeu ao pedido do Ministério Público Federal (MPF) e majorou a pena aplicada em primeiro grau em um ano, dois meses e dez dias de detenção. No entendimento dos magistrados, foram apresentadas provas incontroversas da autoria delitiva. O acusado obteve vista dos autos processuais pelo prazo de cinco dias, efetivou a carga de retirada no início de junho de 2013, mas efetuou a devolução somente em outubro de 2013.

De acordo com o desembargador federal Nino Toldo, a sonegação de autos judiciais constitui crime contra a Administração da Justiça e pode ser praticado mediante conduta omissiva. Para que seja caracterizado, é necessário que o defensor ou profissional autorizado oculte ou inutilize processo judicial, documento ou objeto de valor probante.

“O acusado, na qualidade de advogado constituído para a defesa de sua mãe em ação penal, deliberadamente reteve os autos, excedendo o permissivo legal e judicial, com o escopo de favorecer a parte assistida com a superveniência da prescrição da pretensão punitiva estatal”, destacou o magistrado.

O réu pediu a absolvição sob a alegação de que a conduta não seria crime. Para o relator do acórdão, embora ele tenha argumentado que não houve má-fé de sua parte, a prova evidenciou que o ato retardou a condenação criminal, pelo descumprimento do prazo para devolução. Segundo o magistrado, o advogado usou justificativas e manobras furtivas, como o não atendimento de ligações efetuadas e a afirmação falsa de que outro defensor já teria restituído o processo judicial em cartório.

“O comportamento dissimulado aliado ao conhecimento técnico que certamente detinha, no sentido de que o prazo prescricional da pretensão punitiva correria pela metade caso a sua mãe completasse 70 anos antes de publicada a sentença, denotam com suficiente grau de certeza o dolo de sonegar os autos com a motivação de frustrar a persecução penal”, concluiu Nino Toldo.

A pena aplicada totalizou dois anos, quatro meses e 20 dias de detenção, no regime inicial aberto, com substituição da pena corporal por duas penas restritivas de direito. Por maioria, a Turma decidiu fixar a pena de multa em 24 dias. O causídico foi enquadrado no artigo 356 do Código Penal

Apelação Criminal nº 0001593-21.2014.4.03.6122/SP

NOTO DO ESCRITÓRIO

Em acréscimo a matéria colacionamos a ementa do acórdão:

APELAÇÕES CRIMINAIS. DELITO DE SONEGAÇÃO DE AUTOS (ART. 356 DO CÓDIGO PENAL). MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS DOCUMENTALMENTE. DOLO EVIDENCIADO PELO ESCOPO DE PREJUDICAR A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA, PROCRASTINANDO FEITO CRIMINAL A FIM DE ACARRETAR A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DA PARTE ASSISTIDA PELO ACUSADO. DOSIMETRIA PENAL REVISTA PARA AUMENTAR A REPRIMENDA, ATENDENDO AO PLEITO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. APELO DEFENSIVO PROVIDO APENAS PARA REDUZIR A QUANTIDADE E O VALOR DE CADA DIA-MULTA.
1. A sonegação de autos judiciais constitui delito contra a Administração da Justiça, encontrando tipificação no art. 356 do Código Penal. Trata-se de crime formal e que pode ser praticado mediante conduta omissiva, caso em que se consuma com a inércia ou recusa em devolver os autos processuais na forma da lei ou do comando judicial. Independe, por conseguinte, da obtenção do resultado suposto. Para a caracterização do delito em questão, exige-se que o advogado ou profissional autorizado deliberadamente dê cabo à vontade de sonegar ou inutilizar autos, documento ou objeto de valor probante, não se confundindo com a conduta meramente desidiosa ou irresponsável.
2. No caso dos autos, o acusado, na qualidade de advogado constituído para a defesa de sua mãe em ação penal, deliberadamente reteve os autos, excedendo o permissivo legal e judicial, com o escopo de favorecer a parte assistida com a superveniência da prescrição da pretensão punitiva estatal.
3. Prova incontroversa de que o acusado obteve vista dos autos processuais pelo prazo de 5 dias, efetivando a carga dos autos na data de 07.06.2013, tendo efetuado a devolução somente em 03.10.2013, apesar de pessoalmente intimado em 02.08.2013.
4. Embora o acusado insista na tese de que não teria havido dolo de sua parte, a prova dos autos evidencia que retardou a condenação criminal, tergiversando acerca do descumprimento do prazo para devolução dos autos mediante justificativas e manobras claramente furtivas, como o não atendimento das ligações efetuadas pela serventia judicial ao seu escritório, a afirmação falsa de que outro advogado já teria restituído os autos em cartório, bem como a própria remessa mediante Correios somente posteriormente a um suposto período de greve postal, descumprindo determinação judicial para que providenciasse de maneira expedida a restituição.
5. O comportamento dissimulado aliado ao conhecimento técnico que certamente detinha, no sentido de que o prazo prescricional da pretensão punitiva correria pela metade caso a sua mãe completasse 70 anos antes de publicada a sentença, denotam com suficiente grau de certeza o dolo de sonegar os autos com a motivação de frustrar a persecução penal.
6. Apesar de o acusado reafirmar que sua conduta seria atípica por conta de que teria restituído os autos dentro do prazo prescricional, o crime de sonegação de autos, na modalidade em que praticado, configura-se como delito omissivo e formal, que se consuma com a mera retenção ilegal dos autos, prologando-se no tempo enquanto não devidamente restituído, independentemente do atingimento do fim pretendido pelo agente. Consequentemente, a eventual devolução intempestiva não faz desaparecer a infração penal já perpetrada.
7. Dosimetria penal revista para exasperar as penas. Pena de prestação pecuniária abrandada para 05 (cinco) salários mínimos vigentes à época dos fatos em favor da União. Fixação da quantidade de dias-multa proporcionalmente à fixação da pena corporal, conforme precedentes desta Turma.
8. Apelação do Ministério Público Federal provida. Apelo defensivo provido em parte. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim – APELAÇÃO CRIMINAL – 76531 – 0001593-21.2014.4.03.6122, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 23/04/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/06/2020)

Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região Autor: Assessoria de Comunicação Social do TRF3
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