Parecer da AGU autoriza repasses de recursos, por meio de emenda parlamentar impositiva, a estados e municípios inadimplentes

Os ministérios e autarquias federais devem repassar para estados e municípios a verba destinada por emendas parlamentares individuais impositivas mesmo que os entes beneficiados estejam com alguma pendência no Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias, o CAUC. É o que define parecer elaborado pela Advocacia-Geral da União (AGU) que ganhou efeito vinculante após ser ratificado pelo presidente Jair Bolsonaro, ou seja, terá que ser observado por todos os gestores do Poder Executivo Federal de agora em diante.

Antes do parecer, gestores de alguns ministérios e autarquias entendiam que o repasse não deveria ser feito quando os estados e municípios que receberiam a verba destinada pelas emendas estivessem inscritos no CAUC em virtude do descumprimento de alguma exigência constitucional, como estar em dia com o pagamento de empréstimos e investir determinado percentual da receita em educação e saúde.

Mas o entendimento da AGU, elaborado justamente para esclarecer dúvidas de ministérios sobre a regularidade dos repasses, é o de que a transferência de recursos oriundos das emendas parlamentares independe da adimplência dos entes desde 2016, em virtude da Emenda Constitucional nº 86/2015 – que tornou obrigatória a execução dos valores.

A obrigatoriedade, assinala trecho do parecer, é especialmente evidente no caso das emendas que destinam recursos para a saúde, uma vez que “decorre primordialmente do fundamento que veda ao Estado exercer uma proteção ineficiente dos direitos fundamentais”, conforme “tendência contemporânea do Supremo Tribunal Federal na interpretação dos direitos fundamentais de prestação estatal positiva, sobretudo no campo da saúde”.

O parecer observa, ainda, que as únicas hipóteses que autorizam a administração pública a não executar os recursos das emendas foram previstas pela própria EC nº 86/15, quais sejam: impedimento de ordem técnica ou contingenciamento admitido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Desta forma, não é possível que norma infraconstitucional ou mesmo norma constitucional anterior à entrada em vigor da emenda impossibilite o repasse – sobretudo à luz de princípios como o da supremacia da Constituição e o da máxima efetividade das normas constitucionais.

NOTA DO ESCRITÓRIO

O parecer deve ser obrigatoriamente observado por gestores da administração pública federal. A orientação ganhou o chamado efeito vinculante após ser ratificada pelo presidente da República.

Os pareceres vinculantes são uma forma de adequar os atos da administração à jurisprudência de tribunais e ao ordenamento jurídico, acabando com eventuais divergências na interpretação de leis e outras normas.

Vejamos a ementa do PARECER PLENÁRIO n. 00001/2019/CNU/CGU/AGU:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. EMENDAS PARLAMENTARES INDIVIDUAIS (EPIs). EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 86/2015. § 13 DO ART. 166 DA CF/88. EXPRESSÃO “INDEPENDERÁ DA ADIMPLÊNCIA”. ALCANCE DA NORMA. INTERPRETAÇÃO PELA CNU.
I – O disposto no § 13 do art. 166 da CF/88 trata-se de norma de aplicabilidade imediata, embora de eficácia contida, nos termos do inciso III do § 9º do art. 165 da Constituição Federal.
II – As EPIs não podem ser enquadradas de forma geral e excludente na figura das transferências obrigatórias, e tampouco na figura das transferências voluntárias, porque tais emendas impositivas atraem elementos jurídicos das duas figuras e, portanto, configuram um terceiro tipo, de natureza sui generis.
III – As EPIs que se insiram no percentual destinado a ‘ações e serviços públicos de saúde’, ao serem pelo § 10 do art. 166 da CF/1988 associadas ao inciso I do § 2º do art. 198 da CF/1988, acabam por integrar esses 0,6% ao percentual obrigatório de destinação de 15% (quinze por cento) da receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro a tais ações e serviços, tornando-se obrigatórias a fundamento constitucional autônomo.
IV – O caráter normativo cogente da expressão “independerá da adimplência”, inserta no § 13 do art. 166 da CF/88, não pode ser excepcionado de alguma forma por lei ou ato normativo.
V – A expressão “independerá da adimplência” do § 13 do art. 166 da CF/88 não pode ser excepcionada por dispositivo constitucional anterior à sua vigência.

Lembramos ainda do art. 31, da Portaria Interministerial nº 78, de 26 de fevereiro de 2019,  que dispõe sobre procedimentos e prazos para operacionalização das emendas parlamentares individuais de execução obrigatória, bem como sobre procedimentos e prazos para a superação de impedimentos de ordem técnica, em atendimento ao disposto no art. 166, §§ 9º a 18, da Constituição Federal, normatizou de forma semelhante ao parecer vinculante:

Art. 31. A transferência obrigatória da União para a execução de emendas individuais a Estados, Municípios e ao Distrito Federal independerá da adimplência do ente federativo destinatário, conforme o art. 166, § 13, da Constituição Federal, e o Parecer nº 00016/2016/DECOR/CGU/AGU, de 13 de maio de 2016, do Departamento de Coordenação e Orientação de Órgãos Jurídicos da Consultoria-Geral da União.

Leia a íntegra do parecer aqui.

Comentários