TRF1: Configuração da improbidade administrativa depende da demonstração dos elementos objetivo e subjetivo

A 4ª Turma do TRF 1ª Região absolveu o apelante, servidor público federal, da prática de ato de improbidade administrativa quando exerceu a chefia do Distrito Sanitário Especial Indígena do Alto Solimões (AM). Ele foi condenado em primeira instância pela compra de combustíveis de origem estrangeira para abastecer os veículos e equipamentos do órgão sem a observância dos procedimentos legais, causando prejuízo ao erário no valor de R$ 4.770,00.

Na apelação, o servidor da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) sustentou ser parte ilegítima passiva, uma vez que não realizava a compra de combustível, nem poderia fazê-lo, já que a compra de tais insumos era feita em Brasília (DF), por meio de licitação, para fornecimento em todo o território nacional. Alegou ter ficado devidamente comprovado que a compra de combustíveis era feita mediante o uso do cartão fornecido pela Ticket Serviços S/A, nos postos credenciados, não existindo, portanto, compra direta.
Para o relator, desembargador federal Olindo Menezes, o servidor apelante tem razão em seus argumentos. “Pelo Contrato nº 34/2004, celebrado entre a Funasa e a empresa Ticket Serviços S/A, depois do Edital de Pregão nº 26/2004, incumbiria à empresa a prestação à Funasa de serviços de gerenciamento de unidades de abastecimento com fornecimento contínuo e ininterrupto de combustível, em todo o território nacional, através de tecnologia informatizada, com uso de cartões eletrônicos, bem como credenciar e disponibilizar postos de abastecimento sempre que houvesse solicitação da Funasa”, pontuou.
O magistrado também esclareceu em seu voto que o servidor fazia o acompanhamento local do contrato, e distribuía os cartões fornecidos pela Ticket aos seus usuários finais, cabendo-lhe apenas autorizar o abastecimento das viaturas e equipamentos através do cartão, utilizado por meio de senha pessoal.
“Mesmo que isso tivesse sido provada a autoria, a realidade é que não houve nenhum prejuízo. A gasolina, nacional ou colombiana, prestava-se à sua finalidade, não havendo nenhuma reclamação ou constatação de que fosse produto inservível ou adulterado, pelo que o seu custo, na ordem de R$ 4.770,00, não pode ser considerado como dano ao erário”, finalizou o relator.
A decisão foi unânime.
Processo nº: 0001012-69.2009.4.01.3201/AM
Data do julgamento: 15/5/2018
Data da publicação: 29/05/2018
NOTA DO ESCRITÓRIO
Segue abaixo a ementa do acórdão:
“ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR DA FUNASA. CHEFIA DO DISTRITO SANITÁRIO DO ALTO SOLIMÕES. CONTROLE E FISCALIZAÇÃO DA COMPRA DE COMBUSTÍVEIS. AUTORIZAÇÃO DE ABASTECIMENTO. APREENSÃO DE COMBUSTÍVEL DE ORIGEM ESTRANGEIRA EM FLUTUANTE DA FUNASA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE CONDUTA ÍMPROBA. AUSÊNCIA DE DANOS AO ERÁRIO. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DO SERVIDOR. APELAÇÃO DA FUNASA PREJUDICADA.
1. Nos termos da petição inicial, adotados pela sentença, o apelante, Chefe do Distrito Sanitário Especial Indígena do Alto Solimões, e responsável pelo controle, fiscalização e compra de combustíveis para abastecer os veículos e equipamentos do órgão, ao adquirir gasolina estrangeira (1.800 litros), avaliada em R$4.770,00, em desobediência aos procedimentos legais, cometeu ato de improbidade nos termos do art. 10, XI – lei 8.429/92 (“liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular”).
2. O apelante não tinha entre as suas atribuições a aquisição de combustível e nem poderia fazê-lo, já que a compra do produto era feita em Brasília-DF, por meio de licitação para fornecimento em todo o Brasil, pela Presidência da Fundação Nacional de Saúde. A aquisição era feita a partir de Brasília/DF, como também os respectivos pagamentos.
3. Pelo Contrato nº 34/2004, celebrado entre a FUNASA e a empresa TICKET SERVIÇOS S/A, depois do Edital de Pregão nº 26/2004, incumbiria à empresa a prestação à FUNASA de serviços de gerenciamento de unidades de abastecimento com fornecimento contínuo e ininterrupto de combustível, em todo o território nacional, através de tecnologia informatizada, com uso de cartões eletrônicos, bem como credenciar e disponibilizar postos de abastecimento sempre que houvesse solicitação da FUNASA.
4. O servidor fazia o acompanhamento local do contrato, e distribuía os “Ticket Car” aos seus usuários finais, cabendo-lhe apenas autorizar o abastecimento das viaturas e equipamentos através do cartão Ticket Car, utilizado por meio de senha pessoal. Não tinha como atribuição a compra física do combustível, nem a FUNASA afirma que lhe passava recursos para essa finalidade. Competia-lhe apenas autorizar o abastecimento.
5. As compras efetuadas com o uso do Cartão Ticket Car não eram compras físicas do produto, senão a formalização dessa operação junto aos postos credenciados (autorização de abastecimento), a partir da licitação feita nacionalmente em Brasília. Se os postos credenciados, notadamente aquele ligado ao combustível apreendido, adquiriam o produto na Colômbia, onde era mais barato, cuida-se de aspecto interno de cada empresa, estranho ao controle do apelante.
6. Incumbia ao MPF, autor da acusação – de que adquirira combustível com verba pública em desacordo com os devidos normativos -, a prova da imputação, que, na ordem natural das coisas, sequer faz sentido dentro da sistemática adotada pela FUNASA para a aquisição do produto em todo o Brasil.
7. Mesmo que isso tivesse sido provada a autoria, a realidade é que não houve nenhum prejuízo. A gasolina, nacional ou colombiana, prestava-se à sua finalidade, não havendo nenhuma reclamação ou constatação de que fosse produto inservível ou adulterado, pelo que o seu custo, na ordem de R$4.770,00, não pode ser considerado como dano ao erário.
8. A configuração dos atos de improbidade administrativa do art. 10 da Lei 8.429/92 exige a presença de dois requisitos: um de caráter objetivo, radicado no efetivo dano ao erário, e o outro de cunho subjetivo, da parte do agente reputado ímprobo. O elemento subjetivo deve estar sempre presente para a configuração da conduta ímproba, admitindo-se a modalidade culposa somente nas hipóteses de atos que acarretem lesão ao erário, por expressa disposição legal.
9. O fato – apreensão de 1.800 litros de gasolina colombiana, em 23 de julho de 2005 -, sem prova inequívoca, não pode ser imputado (dedutivamente) ao apelante como ato de improbidade. Não ficou comprovado que tenha agido com propósitos malsãos, com dolo ou culpa grave, ou ainda que tenha havido dano ao erário ou enriquecimento ilícito.
10. Apelação do acusado provida. Apelação da FUNASA prejudicada.” (TRF1 – Apelação nº 0001012-69.2009.4.01.3201, Rel. Des. Fed. OLINDO MENEZES, Quarta Turma, julgado em 15.05.2018, e-DJF1 de 29.05.2018)
Fonte: Tribunal Regional Federal da 1ª Região Autor: Assessoria de Comunicação Social
Comentários