O Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu o uso de verbas de precatórios do Fundef. O ministro Walton Alencar Rodrigues concedeu a cautelar em sessão do Plenário. A medida impacta Estados e Municípios beneficiários de precatórios – ordens judiciais para pagamento de débitos – da União na complementação ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que vigorou entre 1998 e 2006. A cautelar suspende o uso de recursos desses precatórios no pagamento a professores ou quaisquer servidores públicos até a conclusão da análise, no TCU, sobre a destinação correta para essas verbas.
O Tribunal, responsável pela fiscalização da aplicação dos recursos federais, avaliará os critérios de uso das verbas dos precatórios do Fundef – se eles podem ser usados para remuneração, pagamento de passivos trabalhistas ou bônus de professores, por exemplo. Enquanto não houver uma decisão, os recursos desses precatórios não poderão ser utilizados.
O Fundef foi substituído pelo Fundeb, que foi criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007. O fundo é formado principalmente por recursos estaduais. Há, porém, Estados que recebem complementação da União. Isso ocorre quando o Estado não tem condições de arcar com o valor mínimo definido nacionalmente por aluno.
Durante a vigência do Fundef, porém, a União não fez o repasse integral da complementação devida a alguns Estados. O passivo da União em relação a erros de cálculo no âmbito do Fundef, no período de 1998 a 2006, pode alcançar R$ 90 bilhões. O valor corresponde a cerca de 60% dos R$ 148 bilhões previstos para o Fundeb no exercício de 2018, segundo estimativa publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 29 de dezembro de 2017.
Histórico
Na cautelar, o ministro Walton cita decisões recentes da Corte de Contas sobre o tema. Depois de ser acionado pela rede de órgãos de controle do Estado do Maranhão – que questionou o uso de recursos do Fundef para pagar honorários de escritórios de advocacia nas ações que resultaram em precatórios –, e considerando que o problema envolvia outros Estados, o TCU publicou o Acórdão nº 1.824/2017-Plenário, determinando que os recursos dos precatórios referentes ao Fundef deveriam ser utilizados exclusivamente na educação. O pagamento dos escritórios de advocacia deveria vir de outra fonte de receita.
Posteriormente, o TCU publicou nova decisão – Acórdão nº 1.962/2017-Plenário – para esclarecer outra questão relacionada aos precatórios, a subvinculação. Segundo o artigo 22 da Lei nº 11.494/2007, “pelo menos 60% dos recursos anuais totais dos Fundos serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício na rede pública”.
A dúvida era se os recursos especificamente dos precatórios, já que eram relacionados ao Fundef, deveriam ter a destinação mínima de 60% para a remuneração de professores, questão que provocou uma pluralidade de entendimentos entre instituições como tribunais de contas estaduais e sindicatos de professores. A conclusão do TCU, expressa no Acórdão 1.962/2017, é de que a natureza extraordinária dos recursos dos precatórios desobriga essa subvinculação – entendimento validado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Cautelar
Para garantir maior rapidez e efetividade na comunicação relacionada à medida cautelar, o ministro Walton diz que será determinado ao Ministério da Educação (MEC) que, no prazo de 15 dias, encaminhe aos Estados e Municípios com precatórios referentes ao Fundef cópia integral da medida cautelar, uma vez que poderão ser responsabilizados pelo TCU, caso não observância os entendimentos da Corte de Contas a respeito do tema.
Serviço:
Leia a íntegra da decisão: Acórdão 1518/2018 – Plenário
Processo: TC 020.079/2018-4
NOTA DO ESCRITÓRIO
Importante destacar, diante do equívoco de alguns sites de notícias, que informam que o TCU reavaliará a possibilidade do rateio de 60% entre os profissionais do magistério. Em verdade, o que a Corte de Contas elucidará é se pode ou não serem utilizados os recursos advindos dos precatórios com o pagamento de remuneração e seus derivados, ou seja, não discutirá a subvinculação ou obrigatoriedade mínima de gastos com salários. Isso já ficou indene de dúvida no Acórdão 1.962/2017-Plenário.
Vejamos um trecho do voto do Ministro relator:
“Nada mais lógico, pois o simples rateio de montante tão substancial de recursos, recebidos de forma extraordinária, entre os profissionais do magistério, pouco ou nada contribui para a manutenção ou desenvolvimento do ensino e o alcance das metas previstas no Plano Nacional de Educação.
Não há dúvidas, portanto, de que a hipótese ora tratada, de recebimento excepcional de recursos federais, em decorrência de decisão judicial, não se subsome ao previsto no artigo 22, da Lei 11.494/2007, como definido no subitem 9.2.1.2, do Acórdão 1.962/2017 – Plenário.
Não obstante, alguns aspectos práticos remanescem indefinidos. Além da já mencionada dúvida quanto à possibilidade de pagamento aos profissionais do magistério em percentual inferior ao previsto no aludido dispositivo legal, a unidade instrutiva questiona se seria possível utilizar tais recursos para quitação de passivos (remunerações e encargos previdenciários) ou mesmo para a complementação, de forma excepcional, do pagamento da folha normal e ordinária dos profissionais do magistério em efetivo exercício na rede pública, nos casos em que haja frustração de receitas municipais para garantir os pagamentos devidos.
(…)
Ante o exposto, acolhendo as conclusões da unidade instrutiva:
I) determino, cautelarmente, nos termos do artigo 276, caput, do Regimento Interno/TCU, aos entes municipais e estaduais beneficiários de precatórios provenientes da diferença no cálculo da complementação devida pela União, no âmbito do Fundef, que se abstenham de utilizar tais recursos no pagamento a profissionais do magistério ou a quaisquer outros servidores públicos, a qualquer título, a exemplo de remuneração, salário, abono ou rateio, até que este Tribunal decida sobre o mérito das questões suscitadas no presente feito;”
Por fim, não podemos deixar de registrar – com felicidade – que no acórdão aqui debatido, o TCU fez menção a matéria publicada em nosso site, colacionando o seguinte excerto:
“Vale sublinhar que os valores a serem recebidos pelos municípios ostentam nítido caráter indenizatório (não tributário), por constituir ressarcimento, ao Tesouro Municipal, de recursos próprios despendidos em virtude do repasse a menor, pela União.
A alegação de destinação vinculada, em face da redação contida no art. 60 do ADCT e do art. 22 da Lei no 11.494/07, não há como prosperar, porquanto os citados dispositivos referem-se a hipótese de pagamento espontâneo pelo Governo Federal, através de orçamento e despesa especifica, o que não aconteceu no caso dos presentes autos, onde os créditos a serem recebidos pelos municípios possuem regramento próprio (art. 100 da Carta Republicana).
Dessa forma, nota-se que a tese de que os 60% dos precatórios do FUNDEF devem se destinar aos salários dos profissionais do magistério não tem encontrado amparo no STF, TCU, TJPE e TCE/PE (página de escritório de advocacia, 11/5/2018, peça 11)“