Afinal, candidato pode ou não pode participar de inaugurações de obras públicas?

O art. 77, da Lei nº 9.504/1997, em sua redação original, tinha o seguinte o teor:

Art. 77. É proibido aos candidatos a cargos do Poder Executivo participar, nos 3 (três) meses que precedem o pleito, de inaugurações de obras públicas.

Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita o infrator à cassação do registro.

Com o advento da Lei nº 12.034/2009, o referido dispositivo sofreu alteração em seu texto, vejamos:

Art. 77.  É proibido a qualquer candidato comparecer, nos 3 (três) meses que precedem o pleito, a inaugurações de obras públicas.

Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita o infrator à cassação do registro ou do diploma.

Verifica-se a mudança do verbo participar para comparecer. Com esta inovação, à época, abria-se a possibilidade da interpretação de que a mera presença poderia acarretar sanções ao infrator.

Ocorre que o Tribunal Superior de Eleitoral flexibilizou esse enrijecimento do tipo legal aplicando ao caso, a depender do comportamento do candidato, o princípio da proporcionalidade para afastar a cassação do registro ou do diploma, quando a presença do candidato em inauguração de obra pública acontecer de forma discreta, sem participação ativa na solenidade.

Sobre o tema é assentada a jurisprudência do TSE:

“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA. COMPARECIMENTO À INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA. ART. 77 DA LEI Nº 9.504/97. PARTICIPAÇÃO ATIVA DA CANDIDATA DURANTE O EVENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. REEXAME. SÚMULA Nº 24/TSE. NÃO PROVIMENTO.
Histórico da demanda
1. Contra acórdão de TRE/SP pelo qual mantida sentença de improcedência da representação proposta em desfavor de Juliana Cardoso – candidata à reeleição para o cargo de vereador – por conduta vedada com fundamento no art. 77, caput, da Lei nº 9.504/97, interpôs recurso especial o Ministério Público Eleitoral.
2. Negado seguimento ao recurso, monocraticamente, pelos seguintes fundamentos: (i) a resolução da controvérsia independe da pretensa análise relativa ao conceito e à abrangência da expressão “inauguração de obra pública”; (ii)aplicável o princípio da proporcionalidade consoante iterativa jurisprudência desta Corte Superior, uma vez assentado no aresto regional a ausência de elementos probatórios que apontassem a ativa participação da candidata no evento; e (iii)impossibilitado o reexame do conjunto probatório dos autos, nos termos da Súmula nº 24/TSE.
Do agravo regimental.
3. A jurisprudência desta Corte Superior admite a aplicação do princípio da proporcionalidade na representação por conduta vedada descrita no art. 77 da Lei nº 9.504/97, para afastar a sanção de cassação do diploma, quando a presença do candidato em inauguração de obra pública ocorre de forma discreta e sem participação ativa no evento, pois não resulta na quebra da igualdade de chances entre os concorrentes na disputa eleitoral.
4. Inalterável a premissa fática constante do aresto regional de que ausente protagonismo da candidata durante o evento, por força da Súmula nº 24/TSE, conclui-se que a decisão recorrida está alinhada à jurisprudência deste Tribunal Superior.
Agravo regimental não provido.” (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 171064, Relator(a) Min. ROSA WEBER, Publicação:  DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 154, Data 03/08/2018, Página 445-446)

“ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. VEREADOR. CONDUTA VEDADA. COMPARECIMENTO À INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA. ART. 77 DA LEI No 9.504/97. CONCLUSÃO REGIONAL: PARTICIPAÇÃO SEM DESTAQUE. AUSÊNCIA DE DESEQUILÍBRIO DO PLEITO. PROPORCIONALIDADE. SANÇÃO DE CASSAÇÃO. INADEQUAÇÃO AO CASO. ACERVO PROBATÓRIO. REEXAME. INSTÂNCIA ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA No 24/TSE. DESPROVIMENTO.
1. A jurisprudência do TSE admite a aplicação do princípio da proporcionalidade na representação por conduta vedada descrita no art. 77 da Lei no 9.504/97, para afastar a sanção de cassação do diploma, quando a presença do candidato em inauguração de obra pública ocorre de forma discreta e sem a sua participação ativa na solenidade, de modo a não acarretar a quebra de chances entre os players (AgR-REspe nº 1260-25/SE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 5.9.2016; RO nº 1984-03/ES, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 12.9.2016; AgR-REspe nº 473-71/PB, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 27.10.2014).
2. In casu, no exame do caderno probatório, o TRE, embora reconhecendo o comparecimento do candidato, assentou que a sua presença no evento se deu sem qualquer destaque que pudesse comprometer minimamente o equilíbrio do pleito, motivo pelo qual deixou de aplicar a sanção de cassação.
3. A partir da moldura fática delineada no acórdão regional, cuja revisão, nesta instância, demandaria o vedado reexame de fatos e provas (Súmula no 24/TSE), tem-se que a conclusão regional está alinhada com a jurisprudência deste Tribunal.
4. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (TSE– Agravo de Instrumento nº 49645, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 188, Data 28/09/2017, Página 80)

“ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONDUTA VEDADA AO AGENTE PÚBLICO (LEI DAS ELEIÇÕES, ART. 77). CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. COMPARECIMENTO À INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. INCIDÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO DO ILÍCITO. ACÓRDÃO REGIONAL EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. DECISÃO MANTIDA. DESPROVIMENTO.
1. O princípio da proporcionalidade aplicado no âmbito do art. 77 da Lei n° 9.504/97 é admitido para afastar a configuração do ilícito eleitoral, quando a presença do candidato se dá de forma discreta e sem sua participação ativa no evento, porquanto, nessas hipóteses, não se verifica a quebra da igualdade de chances entre os candidatos na disputa eleitoral (AgR-REspe n° 473-71/PB, Redator para o acórdão Min. João Otávio de Noronha, DJe de 27.10.2014 e AgR-AI n° 1781-90/RO, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 6.12.2013).
2. In casu, consta do aresto regional que a presença da candidata deu-se de forma discreta, sem qualquer destaque ou manifestação perante o reduzido número de presentes, não havendo sua participação ativa no evento. Dessa forma, aplica-se ao caso o princípio da proporcionalidade, a fim de que seja afastada a caracterização do ilícito eleitoral, ex vi da jurisprudência sedimentada por esta Corte Superior.
3. Agravo regimental desprovido.” (TSE– Recurso Especial Eleitoral nº 126025, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Data 05/09/2016)

Nota-se, portanto, que o comparecimento comedido, sem destaques a presença do candidato, é conduta não censurável pelo entendimento da Corte Superior Eleitoral podendo o candidato participar de qualquer solenidade de inauguração de obra pública. Além do que, as inaugurações são atos públicos franqueados a todos que queiram presenciar o evento, inclusive, a todo e qualquer pretendente a mandato eletivo.

Outra questão que sempre vem à tona nas eleições gerais é se as condutas vedadas se estendem as ações municipais já que os candidatos não pleiteiam cargos municipais.

O caput do art. 73, da Lei nº 9.504/1997 traz a presunção legal de que as condutas vedadas são tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

Logo, para a sua aplicação, é necessário que a conduta esteja relacionada com o pleito eleitoral, o qual se realiza em circunscrições (Código Eleitoral, art. 86).

Daí é que, por exemplo, o TSE já entendeu, em aresto nem tão recente, que o comparecimento de candidato à inauguração de obra pública realizada em município fora da circunscrição do pleito não atrai a incidência da conduta vedada prevista no art. 77 da Lei das Eleições:

“RECURSO ESPECIAL. REGISTRO. CANDIDATO. PREFEITO. CONDUTA VEDADA. PARTICIPAÇÃO. INAUGURAÇÃO. OBRA PÚBLICA. MUNICÍPIO DIVERSO. PERÍODO. PROIBIÇÃO. ART. 77 DA LEI Nº 9.504/97. ABUSO. PODER POLÍTICO. INELEGIBILIDADE. INEXISTÊNCIA.
1. Não constitui conduta a ser alcançada pelo art. 77 da Lei nº 9.504/97 a participação de candidato em inauguração de obra pública, fora da circunscrição territorial pela qual disputa cargo eletivo, considerado o conceito do art. 86 do Código Eleitoral.
2. Além do mais, cuidando-se de obra pública, em local público e de acesso a qualquer pessoa, nada impedia que dela participassem todos os candidatos.
3. O que a lei pretende vedar é a utilização indevida, ou o desvirtuamento da inauguração em prol de candidato, fato, aliás, que pode ser apurado na forma dos arts. 19 e 22 da Lei Complementar nº 64/90. Precedentes: Acórdãos nos 4.511, de 23.3.2004, Ag nº 4.511; 21.167, de 21.8.2003, EDclREspe nº 21.167, da relatoria do Min. Fernando Neves.” (TSE– Recurso Especial Eleitoral nº 24122, Relator(a) Min. Carlos Eduardo Caputo Bastos, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 01/10/2004)

Realmente, as vedações do art. 73, da Lei nº 9.504/1997, em regra geral, são voltadas aos cargos que estão disputa na circunscrição do pleito, apesar de algumas situações, como a do art. 73, incisos I, II, III e IV, por exemplo, aplicar-se a qualquer esfera governamental, bem como nos casos de desvirtuamentos e manobras para beneficiar determinado candidato.

Fica assim esclarecido que, nessas Eleições 2018, os candidatos podem participar de inaugurações de obras públicas, desde que de forma discreta, sem destaques e manifestações. Nos casos de solenidades municipais, em tese, sequer a vedação existe, mas o ato público, a despeito da inaplicabilidade da regra, não pode servir de instrumento em prol da candidatura de determinada figura política.

Por Josembergues Melo

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