O Instituto Brasileiro de Direito Administrativo realizou, no dia 14 de junho de 2019, seminário docente intitulado “Impactos de Lei nº 13.655/18 no Direito Administrativo”.
Na metodologia utilizada, os participantes foram inicialmente divididos em quatro grupos temáticos (Conceitos abertos na LINDB; Proporcionalidade e dificuldades reais; Invalidação e segurança jurídica; Responsabilização pessoal) e elaboraram, individualmente e previamente à data do encontro, papers abordando questões ligadas ao tema central de cada grupo.
Os papers foram enviados aos coordenadores para, a partir da leitura e identificação de convergências e controvérsias, elaborarem o roteiro de debates. No dia do Seminário, cada grupo se reuniu para debater o respectivo tema central, propondo a elaboração de ementas voltadas à análise das questões tratadas. As ementas de cada grupo foram, posteriormente, analisadas por grupo revisor.
Finalmente, foi realizada sessão plenária, com a presença de todos os participantes, para discussão e aprovação das ementas apresentadas por cada grupo. Os enunciados aprovados na sessão plenária referida, por maioria qualificada dos presentes, serão divulgados como “Enunciados relativos à interpretação da Lei de Introdução às Normas do Direto Brasileiro – LINDB e seus impactos no Direito Administrativo”.
“Enunciados relativos à interpretação da Lei de Introdução às Normas do Direto Brasileiro – LINDB e seus impactos no Direito Administrativo”
Instituto Brasileiro de Direito Administrativo – IBDA
1. As expressões “esfera administrativa, controladora e judicial” contidas na LINDB abrangem o exercício de todas as funções estatais que envolvam aplicação do ordenamento jurídico.
2. A motivação exigida pelo parágrafo único do art. 20 da LINDB poderá se dar por remissão a orientações gerais, precedentes administrativos ou atos normativos. A possibilidade de motivação por remissão, contudo, não exime a Administração Pública da análise das particularidades do caso concreto, inclusive para eventual afastamento da orientação geral.
3. A abertura a distintas “possíveis alternativas”, prevista no parágrafo único do art. 20, é imposta a todos os destinatários da LINDB. Os controles administrativo e judicial devem considerar o cenário vivenciado pela Administração ao tempo da decisão ou opinião, reservando-se a possibilidade de indicação pelo controlador, sem juízo de invalidação ou reprovação, de alternativas administrativas mais adequadas para o futuro.
4. As “consequências práticas” às quais se refere o art. 20 da LINDB devem considerar, entre outros fatores, interferências recíprocas em políticas públicas já existentes.
5. A avaliação das consequências práticas, jurídicas e administrativas é indispensável às decisões nas esferas administrativa, controladora e judicial, embora não possa ser utilizada como único fundamento da decisão ou opinião.
6. A referência a “valores jurídicos abstratos” na LINDB não se restringe à interpretação e aplicação de princípios, abrangendo regras e outras normas que contenham conceitos jurídicos indeterminados.
7. Na expressão “regularização” constante do art. 21 da LINDB estão incluídos os deveres de convalidar, converter ou modular efeitos de atos administrativos eivados de vícios sempre que a invalidação puder causar maiores prejuízos ao interesse público do que a manutenção dos efeitos dos atos (saneamento). As medidas de convalidação, conversão, modulação de efeitos e saneamento são prioritárias à invalidação.
8. A expressão “equânime”, contida no parágrafo único do art. 21 da LINDB, não transmite conceito novo que não esteja previsto no ordenamento jurídico, remetendo às ideias de isonomia, razoabilidade, proporcionalidade, equidade e ponderação dos múltiplos interesses em jogo.
9. A expressão “interesse geral” prevista na LINDB significa “interesse público”, conceito que deve ser extraído do ordenamento jurídico.
10. A expressão “ônus e perdas anormais e excessivos”, constante do parágrafo único do art. 21 da LINDB, faz referência à imposição de obrigações de fazer ou não fazer (ônus) e a qualquer tipo de dano, a exemplo dos danos materiais, morais, emergentes e lucros cessantes (perdas), que não se mostrem razoáveis e proporcionais no caso concreto.
11. Na expressão “dificuldades reais” constante do art. 22 da LINDB estão compreendidas carências materiais, deficiências estruturais, físicas, orçamentárias, temporais, de recursos humanos (incluída a qualificação dos agentes) e as circunstâncias jurídicas complexas, a exemplo da atecnia da legislação, as quais não podem paralisar o gestor.
12. No exercício da atividade de controle, a análise dos obstáculos e dificuldades reais do gestor, nos termos do art.22 da LINDB, deve ser feita também mediante a utilização de critérios jurídicos, sem interpretações pautadas em mera subjetividade.
13. A competência para dizer qual é a melhor decisão administrativa é do gestor, não do controlador. O ônus argumentativo da ação controladora que imputa irregularidade ou ilegalidade à conduta é do controlador, estabelecendo-se diálogo necessário e completo com as razões aduzidas pelo gestor.
14. Em homenagem ao princípio da proporcionalidade, a dosimetria necessária à aplicação das sanções será melhor observada quando as circunstâncias agravantes ou atenuantes aplicáveis ao caso forem positivadas preferencialmente em lei, regulamentos, súmulas ou consultas administrativas .
15. Para efeito do disposto no artigo 22, § 2º da LINDB, os conceitos do direito penal podem ser usados na aplicação das sanções, subsidiariamente, desde que derivem de um núcleo comum constitucional entre as matérias, lastreado nos princípios gerais do direito sancionador, sobretudo quando não houver regulação específica.
16. Diante da indeterminação ou amplitude dos conceitos empregados pela lei, se, no caso concreto, a decisão do administrador mostrar-se razoável e conforme o direito, o controlador e o juiz devem respeitá-la, ainda que suas conclusões ou preferências pudessem ser distintas caso estivessem no lugar do gestor.
17. É imprescindível, a partir da ideia de confiança legítima, considerar a expectativa de direito como juridicamente relevante diante do comportamento inovador da Administração Pública, preservando-se o máximo possível as relações jurídicas em andamento. Neste contexto, torna-se obrigatória, sempre para evitar consequências desproporcionais, a criação de regime de transição, com vigência ou modulação para o futuro dos efeitos de novas disposições ou orientações administrativas.
18. A LINDB é norma jurídica que impacta todas as regras de direito público, especialmente aquelas que tratam da responsabilização dos agentes públicos que decidem ou emitem opiniões técnicas.
19. A modalidade culposa de improbidade administrativa não se harmoniza com a Constituição, porque improbidade é ilegalidade qualificada pela intenção desonesta e desleal do agente. Não obstante, analisando-se a legislação infraconstitucional, o art.10 da Lei de Improbidade Administrativa deve ser interpretado de acordo com o art. 28 da LINDB, afastando-se a possibilidade de configuração da improbidade sem a presença de erro grosseiro do agente (culpa grave).
20. O art. 28 da LINDB, para os casos por ele especificados (decisões e opiniões técnicas) disciplinou o § 6o do artigo 37 da Constituição, passando a exigir dolo ou erro grosseiro (culpa grave) também para fins da responsabilidade regressiva do agente público.
21.Os artigos 26 e 27 da LINDB constituem cláusulas gerais autorizadoras de termos de ajustamento, acordos substitutivos, compromissos processuais e instrumentos afins, que permitem a solução consensual de controvérsias.
Tiradentes-MG, 14 de junho de 2019