2ª Turma do TRF5 confirma condenação de réu por compartilhar pornografia infantil na Internet

A Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 manteve, por unanimidade, a condenação do réu, K. A. A. L., à pena privativa de liberdade de 03 anos e 06 meses de reclusão e pagamento de 50 dias-multa, por ele ter compartilhado, em 2015, pornografia infantil na Internet por meio de um programa P2P. O valor unitário do dia-multa foi fixado em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente na data do crime. Haverá ainda correção monetária sobre o valor total no dia do pagamento. A decisão do órgão colegiado confirmou a sentença condenatória proferida em 2018 pelo juízo da 8ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, ao negar provimento à apelação criminal 0000033-35.2017.4.05.8401, interposta pela defesa do réu, que era menor de 21 anos na época do crime. A defesa do réu ainda pode recorrer.

“É notório que o programa usado pelo apelante – ARES -, à semelhança de tantos outros utilizados pelo grande público, faz download (baixa) e upload (transmite/compartilha) arquivos a um só tempo. Não por outro motivo, ganharam tanta popularidade entre os internautas, sendo amplamente usados para baixarem/compartilharem músicas, filmes e, no caso, infelizmente, arquivos com conteúdo pornográfico. Logo, não se mostra verossímil a tese de que o réu, utilizador contumaz da internet e do programa em foco, não soubesse o que é de conhecimento geral: que há transmissão de arquivos simultaneamente aos que são angariados”, escreveu em seu voto o relator do processo, desembargador Paulo Machado Cordeiro.

O inteiro teor da decisão foi publicado no sistema PJe no dia 26 de junho. O julgamento da apelação criminal ocorreu no dia 18 de junho. Participaram da sessão os desembargadores federais Paulo Roberto de Oliveira Lima e Leonardo Henrique de Cavalcante Carvalho.

Segundo a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF), o réu disponibilizou/compartilhou 271 vídeos contendo pornografia infantil na rede mundial de computadores, através do programa intitulado “ARES”, no ano de 2015, entre 03 de fevereiro e 23 de julho. O MPF ainda juntou aos autos Laudo de Perícia Criminal nº 715/2016, em que constaria análise do notebook apreendido, descrevendo a vinculação entre os arquivos compartilhados na internet e o IP, ou seja, código de identificação da máquina do denunciado. O crime de oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio, pornografia infantil está previsto no art. 241-A do Estatuto da Criança e Adolescente – ECA (Lei 8.069/90) e define pena de reclusão que pode ir de três a seis anos e multa.

No apelo, a defesa alegou que o réu apenas havia confessado, em sede de inquérito, que teria baixado os vídeos para assisti-los, não sabendo que haveria compartilhamento através do referido programa usado. O argumento foi rebatido pelo desembargador Paulo Cordeiro, que descreveu a prova pericial realizada no notebook do réu. “A certeza de que os arquivos armazenados pelo apelado eram, também, compartilhados, exatamente nos moldes do art. 241-A do ECA, só veio a ser reforçada pela perícia realizada na máquina (Laudo 715/2016, fls. 57 do IPL), onde especialistas explicaram justamente o funcionamento – dual – de programas desse naipe. Como se não bastasse, o próprio apelante não negou pertencer a si o notebook, tampouco os arquivos que baixava, os quais, inclusive, por saber justamente da ilegalidade, cuidava de parcialmente apagar. Por fim, a própria interface do programa, que segue devidamente estampada nas contrarrazões de apelação, deixa evidente as listas de download e upload realizados num só momento”, detalhou Cordeiro na decisão.

A sentença proferida no dia 2 de fevereiro de 2018 pelo juízo da 8ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte também enfrentou a questão do compartilhamento e do simples download de arquivos. “Na verdade, ao baixar ou efetuar o download dos arquivos e compartilhar, conforme já descrito na denúncia pelo MPF, o acusado está praticando duas condutas intrinsecamente conectadas, não podendo se dissociar, para fins de elucidar o iter criminis. Não se vislumbra a ação de compartilhar sem que antes se possa baixar ou efetuar o download dos arquivos desejados. Nesse diapasão, baixar e compartilhar são uma só conduta, pois, com a tecnologia disponível através do uso de programas de download e uploading em massa, em redes de arquitetura do tipo P2P (Ares, como no caso dos autos) é forçoso concluir que há uma só conduta delituosa e não duas em concurso”, escreveu o juiz federal Orlan Donato Rocha. A decisão ainda considerou como atenuantes o fato de o réu ter confessado e de ser menor de 21 anos na época do crime.

Para o desembargador Paulo Cordeiro, a sentença do Primeiro Grau deve ser mantida integralmente. “A sentença merece ser mantida por seus próprios fundamentos já que, de maneira linear, motivada e alinhavada no apurado de provas, arrematou pela evidência de que o apelante, de modo consciente e voluntário, efetivamente compartilhou – e não apenas armazenou, como quer fazer crer a defesa -, pela rede mundial de computadores, arquivos de conteúdo pornográfico, nos termos do art. 241-A do ECA”, concluiu o magistrado no voto.

Processo relacionado: ACR 0000033-35.2017.4.05.8401

NOTA DO ESCRITÓRIO

Em acréscimo a matéria, colacionamos a ementa do acórdão:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 241-A DO ECA. COMPARTILHAMENTO DE ARQUIVOS COM CONTEÚDO PORNOGRÁFICO. PROVAS DA AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS. DEMONSTRAÇÃO. CONDENAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.
Trata-se de apelação criminal intentada pela defesa de K.A.A.L. em face de sentença condenatória proferida pelo juízo da 8ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte.
Segundo a denúncia, o apelante, entre os dias 03 e 23 de julho de 2015, de modo consciente e voluntário, disponibilizou/compartilhou na rede mundial de computadores, através do programa intitulado “ARES”, 271 vídeos contendo pornografia infantil. A materialidade delitiva teria restado comprovada através do Laudo de Perícia Criminal nº 715/2016, acostado aos autos, em que constaria análise do notebook apreendido.
No documento, descreveu-se a vinculação entre os arquivos compartilhados na internet e o IP, ou seja, código de identificação da máquina do denunciado. Tal conduta, segundo o MPF, enquadrar-se-ia no tipo previsto no art. 241-A da Lei 8.069/90. Por tal motivo, convencido da existência de provas da materialidade e indícios suficientes de autoria, o Parquet ofereceu a peça acusatória.
O juízo, após a merecida instrução processual penal, considerando presentes provas de tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade, condenou o apelante pelo cometimento do delito previsto no art. 241-A, do ECA, à pena privativa de liberdade de 03 anos e 06 meses de reclusão, além de multa. Irresignada com o julgado, a defesa apresentou apelação, sustentando, resumidamente, que: 1) deveria haver modificação na capitulação do tipo penal para o previsto no art. 241-B do ECA, pois o autor do delito somente teria, como confessado em sede de inquérito, baixado os vídeos para assisti-los, não sabendo que haveria compartilhamento através do referido portal; e 2) o apelante desejava participar de crime menos grave, devendo ser aplicado o instituto da cooperação dolosamente distinta.
A sentença merece ser mantida por seus próprios fundamentos já que, de maneira linear, motivada e alinhavada no apurado de provas, arrematou pela evidência de que o apelante, de modo consciente e voluntário, efetivamente compartilhou- e não apenas armazenou, como quer fazer crer a defesa -, pela rede mundial de computadores, arquivos de conteúdo pornográfico, nos termos do art. 214-A do ECA.
As provas, de fato, são tão contundentes quanto vastas. É notório que o programa usado pelo apelante – ARES -, à semelhança de tantos outros utilizados pelo grande público, faz download(baixa) e upload(transmite/compartilha) arquivos a um só tempo. Não por outro motivo, ganharam tanta popularidade entre os internautas, sendo amplamente usados para baixarem/compartilharem músicas, filmes e, no caso, infelizmente, arquivos com conteúdo pornográfico.
Logo, não se mostra verossímil a tese de que o réu, utilizador contumaz da internet e do programa em foco, não soubesse o que é de conhecimento geral: que há transmissão de arquivos simultaneamente aos que são angariados. A certeza de que os arquivos armazenados pelo apelado eram, também, compartilhados, exatamente nos moldes do art. 241-A do ECA, só veio a ser reforçada pela perícia realizada na máquina (Laudo 715/2016, fls. 57 do IPL), onde expertos explicaram justamente o funcionamento – dual – de programas desse naipe.
O próprio apelante não negou pertencer a si o notebook, tampouco os arquivos que baixava, os quais, inclusive, por saber justamente da ilegalidade, cuidava de parcialmente apagar. Por fim, a própria interface do programa, que segue devidamente estampada nas contrarrazões de apelação, deixa evidente – Figura 2 – as listas de download e upload realizados num só momento. Em suma, todas as provas carreadas e somadas levam a uma evidência: o apelante, ao contrário do que afirma, tinha pleno conhecimento de que não apenas armazenava, mas compartilhava os arquivos pornográficos que assistia.
O único pilar em que a defesa busca se sustentar é a declaração do próprio réu – grande interessado na absolvição – no sentido de que simplesmente não sabia que também transmitia os arquivos. Declaração esta que, diante de todos os fundamentos e provas apontados, simplesmente não se reveste de credibilidade mínima.
Sentença mantida na íntegra. Apelação improvida. (TRF5 – Proc. nº 00000033-35.2017.4.05.8401, Rel. Des. Federal PAULO MACHADO CORDEIRO, 2ª Turma, julgado em 26/06/2019, PUBLICAÇÃO: )

Fonte: Tribunal Regional Federal da 5ª Região Autor: Divisão de Comunicação Social
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