Os gastos de natureza indenizatória não devem ser computados na despesa total com pessoal, decide TCE-MG

Versam os autos sobre Consulta formulada por prefeito municipal, vazada nos seguintes termos, ipsis litteris: … considerando as dúvidas pertinentes a inclusão na apuração do limite de pessoal (art. 18, LRF) dos pagamentos das férias indenizadas, conversão de férias em pecúnia, 1/3 de férias – Constituição Federal, e conversão em espécie de férias prémio; pergunta:      

1) O abono pecuniário de férias, o adicional de férias (1/3), as férias indenizadas, e as férias prêmio indenizadas podem ser classificados como verbas de natureza indenizatória, afastando-se a sua contabilização como despesas com pessoal para fins de apuração dos limites legalmente previstos, nos termos do art. 18 da LRF?
2) Sua classificação orçamentária será no elemento 31909400 – indenizações e restituições trabalhistas ou 33909300 – outras indenizações e restituições; sendo certo que ditos elementos não são computados nos gastos de pessoal referido na LRF? 

Conhecida a Consulta por unanimidade, o relator, conselheiro Gilberto Diniz, inicialmente registrou que, no tocante ao primeiro questionamento, embora as análises tenham sido feitas sobre outros enfoques, é pacífico o entendimento deste Tribunal de que a despesa resultante do pagamento de férias – regulamentares e prêmio – convertidas em pecúnia ou indenizadas tem nítido caráter indenizatório, pois visa compensar o não gozo ou fruição de um direito integrante do patrimônio funcional do servidor, o que se depreende das respostas dadas às Consultas 980459, 858327, 797154, 654126.

Salientou, no entanto, que a conversão de férias prêmio em espécie deve ter previsão na legislação local de regência, como, a propósito, ficou consolidado na resposta dada à Consulta n. 654126, e que a indenização de férias – regulamentares e prêmio – somente é possível quando o servidor não as tenha gozado e não mais tenha condições de gozá-las, em virtude de situações esporádicas e excepcionais de interesse público devidamente justificadas, tais como exoneração, demissão, aposentadoria, morte, situações estas que ensejariam a percepção da correspondente indenização.

Na sequência, ressaltou que, nas Consultas em referência, o Tribunal não tratou diretamente da natureza jurídica, se remuneratória ou indenizatória, do abono pecuniário de férias e do adicional de férias (terço constitucional), como também da contabilização, ou não, dos gastos realizados a esses títulos como despesa total com pessoal, para verificação dos limites previstos na Lei Complementar n. 101, de 4.5.2000, Lei de Responsabilidade Fiscal.

Passou a examinar a questão, destacando que é notório o caráter indenizatório do abono pecuniário de férias, uma vez que se destina a recompensar a perda sofrida, in casu, pelo servidor, em virtude do não gozo de parcela do período de suas férias, tal e qual ocorre na hipótese de indenização de férias – regulamentares e prêmio – não gozadas. Sobre a natureza indenizatória/compensatória do terço constitucional de férias, asseverou ser admitida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), e atualmente, está expressamente reconhecida na Lei Federal n. 13.485, que determina a restituição da contribuição previdenciária incidente sobre o terço constitucional de férias, indevidamente recolhida, dada sua reconhecida natureza indenizatória.

Quanto à analise do cômputo, ou não, do valor correspondente ao pagamento dessas verbas como despesa total com pessoal para apuração dos limites legais dispostos na Lei de Responsabilidade Fiscal, a relatoria realçou a existência de entendimentos distintos: uma corrente de pensamento contempla somente a despesa de pessoal de caráter remuneratório, enquanto outra também abarca a despesa de pessoal de cunho indenizatório nesse conceito legal. Em seguida, esclareceu que, no seu entendimento, a primeira corrente seria a mais acertada, porquanto a lei adotou, quanto a esse particular, de forma expressa, o princípio da essencialidade da natureza da despesa pública. Nesse sentido, conforme a definição legal contida no art. 18 da LRF, a despesa total com pessoal constitui “o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias”, e ainda, consoante se infere do § 1º do art. 19 da mesma lei, é possível constatar que foram excluídos do cômputo da despesa total com pessoal aqueles gastos de caráter extraordinário, de cunho eminentemente indenizatório, os quais são, de certa forma, imprevisíveis para a Administração.

A respeito do segundo questionamento do consulente, o conselheiro relator explanou que, conforme se extrai do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público – Mcasp, do Ministério da Fazenda, 8ª edição, na hipótese de pagamento de quaisquer das verbas aludidas no primeiro questionamento, motivadas pela perda da condição de servidor ou empregado público, a correspondente despesa deverá ser apropriada no código 31.90.94 – Despesas Correntes – Pessoal e Encargos Sociais – Aplicações Diretas – Indenizações e Restituições Trabalhistas. Por outro lado, se o pagamento de tais verbas não tiver essa motivação, a respectiva despesa deverá ser contabilizada como despesa bruta com pessoal, em desdobramento próprio do elemento 11 – Vencimentos e Vantagens Fixas – Pessoal Civil, como, por exemplo, abono pecuniário de férias, indenização por férias não gozadas, indenização por licença-prêmio não gozadas, para, depois, ser registrada nas linhas de despesas não computadas, a fim de ser deduzida do cálculo da despesa total com pessoal.

Diante do exposto, o Tribunal Pleno fixou prejulgamento de tese, com caráter normativo, nos seguintes termos:

I) os gastos decorrentes do pagamento de a) abono pecuniário de férias; b) de terço constitucional de férias e c) de férias – regulamentares e prêmio – indenizadas ou convertidas em pecúnia, por ostentarem natureza indenizatória, não devem ser computados na despesa total com pessoal, para efeito de apuração dos limites previstos nos arts. 19 e 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal;
II) caso o pagamento de alguma das verbas aludidas no primeiro questionamento se dê em virtude da perda da condição de servidor ou empregado público, a correspondente despesa deverá ser apropriada no código 31.90.94 – Despesas Correntes – Pessoal e Encargos Sociais – Aplicações Diretas – Indenizações e Restituições Trabalhistas;
III) se o pagamento de tais verbas não tiver essa motivação, a respectiva despesa deverá ser contabilizada como despesa bruta com pessoal, em desdobramento próprio do elemento 11 – Vencimentos e Vantagens Fixas – Pessoal Civil, como, por exemplo, abono pecuniário de férias, indenização por férias não gozadas, indenização por licença-prêmio não gozada, para, depois, ser registrada nas linhas de despesas não computadas, a fim de ser deduzida do cálculo da despesa total com pessoal.

Processo relacionado: Consulta n. 1015780, Rel. Cons. Gilberto Diniz, 11.09.2019).

Fonte: Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais Autor: Informativo de Jurisprudência n. 204
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