Trata-se de Consulta formulada pelo Chefe do Poder Executivo de Campos Belos, questionando, em suma, se:
(1) “Existindo previsão na legislação do município, é possível a incorporação da gratificação pelo exercício de função de confiança ou cargo em comissão na remuneração de servidores públicos ou referida incorporação seria inconstitucional?”; e
(2) “Concluindo pela regularidade de incorporação, seria possível uma segunda incorporação, tendo em vista o que previsto na legislação municipal?”.
O Plenário acolheu na íntegra a proposta de decisão do relator, Cons. Sub. Vasco Cícero Azevedo Jambo.
Em relação ao primeiro questionamento, foi decidido que:
(1.a) segundo o entendimento jurisprudencial do STF, com o objetivo de preservar a estabilidade financeira, havendo previsão legal do respectivo ente federativo é possível a incorporação de gratificação pelo exercício de função de confiança ou cargo em comissão do servidor público que estiver em atividade;
(1.b) a instituição válida da estabilidade financeira deverá observar os seguintes requisitos, sob pena de ser considerada ilegítima e inconstitucional na análise do caso concreto:
I – demonstrar que foram observados os princípios da isonomia, impessoalidade, moralidade, economicidade e equilíbrio das contas públicas, devendo “atender objetivos válidos de valorização e profissionalização do serviço público, sob o pressuposto de incentivar e premiar a assunção de maiores responsabilidades pelo servidor e com a preocupação de evitar um grave decesso remuneratório ao fim do exercício do cargo ou função” (ADI Nº 5.441/SC – MC, rel. Min. Alexandre de Moraes);
II – realizar o devido estudo atuarial para verificar os reflexos que a concessão do referido benefício acarretará no regime próprio de previdência, caso existente; e
III – observar os arts. 169, § 1º, da CR/88 e os arts. 16, 17, caput, e § 1º, 21, I, e 22, parágrafo único, todos da LRF, que estabelecem limitações e requisitos para a criação ou aumento de despesa com pessoal;
(1.c) revela-se inconstitucional, pela afronta ao interesse público e aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a incorporação retroativa de valores a título de estabilidade financeira, não cabendo a contagem de tempo de exercício de cargo ou função anterior à data da edição da lei municipal que instituiu o benefício.
Em seu parecer, o relator ponderou caber a este Tribunal de Contas avaliar eventuais limitações constitucionais e legais para a instituição válida da incorporação de gratificação de função ou cargo em comissão, primando pelo interesse público e pela boa e regular aplicação dos recursos municipais.
Afirmou que, caso verificado no caso concreto que a criação do benefício visa atender interesse pessoal de determinado servidor e não à valorização da carreira pública como um todo, o pagamento poderá ser declarado inconstitucional.
Ressaltou que a incorporação de gratificações poderá caracterizar afronta ao princípio do equilíbrio das contas públicas, caso não seja realizado o devido estudo de impacto financeiro e a criação de medidas compensatórias, podendo tais despesas crescerem descontroladamente, gerando um descompasso entre a arrecadação e os gastos com pessoal.
No que tange ao segundo questionamento, e tendo em vista a exegese do instituto da estabilidade financeira, entendeu não ser permitido:
(2.a) uma segunda incorporação de gratificação, mesmo que pelo exercício de função de confiança ou de cargo em comissão distintos daquele que originou a primeira incorporação; e
(2.b) o pagamento, pelo exercício da mesma ou de nova função de confiança ou de cargo em comissão, da parcela da respectiva gratificação que corresponda até o valor de uma primeira incorporação.
Em conclusão, o TCMGO recomendou que os jurisdicionados adotem medidas no sentido de extinguir o instituto da estabilidade financeira, a exemplo do que foi promovido pela União, por meio da Lei nº 9.527/97, e pelo Estado de Goiás, nos termos da EC nº 10/95, visto que constitui benefício remuneratório que pode ensejar desrespeito a diversos princípios constitucionais, especialmente o da isonomia, e acarretar desequilíbrio orçamentário/financeiro nas contas públicas e atuarial nos Regimes Próprios de Previdência Social.
Revogou-se, por fim, a Resolução Consulta nº 088/00, igualmente promovida pelo município de Campos Belos
Leia o Acórdão-Consulta.
NOTA DO ESCRITÓRIO
Em acréscimo a matéria, colacionamos a ementar do acórdão:
EMENTA: CONSULTA. GRATIFICAÇÃO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO DE CONFIANÇA OU CARGO EM COMISSÃO. PREVISÃO LEGISLATIVA. INCORPORAÇÃO. ESTABILIDADE FINANCEIRA. EFEITOS PROSPECTIVOS (EX NUNC). OBSERVÂNCIA DE PRINCÍPIOS E REQUISITOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS. IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO. RECOMENDAÇÕES.
1. Em homenagem à jurisprudência do STF, considera-se constitucional o instituto da estabilidade financeira, revelando-se possível a incorporação, em atividade, da gratificação pelo exercício de função de confiança ou cargo em comissão, desde que existente expressa previsão legislativa nesse sentido, sendo indevida a contagem de tempo anterior à data da lei que instituiu o benefício, desde que respeitados princípios e requisitos legais e constitucionais aplicáveis ao caso.
2. Tendo em vista a exegese do instituto da estabilidade financeira, não é permitida uma segunda incorporação e nem o pagamento da parcela da gratificação pelo exercício da mesma ou de nova função de confiança ou cargo em comissão que corresponda até o valor de uma primeira incorporação. (TCM/GO -Acórdão-Consulta nº 00024/18. Processo nº 17581/16, Rel. Cons. Subst. Vasco Cícero Azevedo Jambo, 18.12.18)