O órgão competente para o julgamento das contas de gestão de convênios com recursos federais e estaduais é o Tribunal de Contas

A orientação de repercussão geral definida pelo Supremo Tribunal Federal em 17.8.2016 (RE 848.826/CE e 729.744/MG), é de que, nos termos do art. 31 da CF/88, a competência para julgar as contas de governo e as contas de gestão prestadas por Chefe do Poder Executivo Municipal é da respectiva Câmara Municipal. Referidos julgados foram assim ementados:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. PARECER PRÉVIO DO TRIBUNAL DE CONTAS. EFICÁCIA SUJEITA AO CRIVO PARLAMENTAR. COMPETÊNCIA DA CÂMARA MUNICIPAL PARA O JULGAMENTO DAS CONTAS DE GOVERNO E DE GESTÃO. LEI COMPLEMENTAR 64/1990, ALTERADA PELA LEI COMPLEMENTAR 135/2010. INELEGIBILIDADE. DECISÃO IRRECORRÍVEL. ATRIBUIÇÃO DO LEGISLATIVO LOCAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO.
I – Compete à Câmara Municipal o julgamento das contas do chefe do Poder Executivo municipal, com o auxílio dos Tribunais de Contas, que emitirão parecer prévio, cuja eficácia impositiva subsiste e somente deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da casa legislativa (CF, art. 31, § 2º).
II – O Constituinte de 1988 optou por atribuir, indistintamente, o julgamento de todas as contas de responsabilidade dos prefeitos municipais aos vereadores, em respeito à relação de equilíbrio que deve existir entre os Poderes da República (“checks and balances”).
III – A Constituição Federal revela que o órgão competente para lavrar a decisão irrecorrível a que faz referência o art. 1°, I, g, da LC 64/1990, dada pela LC 135/ 2010, é a Câmara Municipal, e não o Tribunal de Contas.
IV – Tese adotada pelo Plenário da Corte: “Para fins do art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990, alterado pela Lei Complementar 135, de 4 de junho de 2010, a apreciação das contas de prefeito, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas Câmaras Municipais, com o auxílio dos Tribunais de Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores”.
V – Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 848826, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 10/08/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-187 DIVULG 23-08-2017 PUBLIC 24-08-2017)

Repercussão Geral. Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Competência da Câmara Municipal para julgamento das contas anuais de prefeito. 2. Parecer técnico emitido pelo Tribunal de Contas. Natureza jurídica opinativa. 3. Cabe exclusivamente ao Poder Legislativo o julgamento das contas anuais do chefe do Poder Executivo municipal. 4. Julgamento ficto das contas por decurso de prazo. Impossibilidade. 5. Aprovação das contas pela Câmara Municipal. Afastamento apenas da inelegibilidade do prefeito. Possibilidade de responsabilização na via civil, criminal ou administrativa. 6. Recurso extraordinário não provido.
Tese adotada pelo Plenário da Corte: “O parecer técnico elaborado pelo Tribunal de Contas tem natureza meramente opinativa, competindo exclusivamente à Câmara de Vereadores o julgamento das contas anuais do Chefe do Poder Executivo local, sendo incabível o julgamento ficto das contas por decurso de prazo.” (RE 729744, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 10/08/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-186 DIVULG 22-08-2017 PUBLIC 23-08-2017)

Tal orientação, contudo, restringe-se, como se vê da própria decisão, às contas de governo e às contas de gestão, para fins do artigo 1º do Inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/90. Não se estende, portanto, ao julgamento de contas prestadas por Prefeito referentes a recursos cuja titularidade não seja própria do Município, mas que derivem de transferência de recursos da União ou Estado, usualmente regulados por instrumento de Convênio, nas quais não é o cargo de quem presta as contas que define a competência para julgamento das contas, mas sim a origem dos recursos aplicados, razão pela qual o julgamento das contas encontra fundamento jurídico no art. 71, II e VI, da Constituição Federal, que assim dispõe:

“Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
(…)
II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;
(…)
VI – fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município;”

Veja-se, nesse sentido, a doutrina de JOSÉ DE RIBAMAR CALDAS FURTADO, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão, em trabalho acerca dos regimes jurídicos aplicáveis às contas públicas:

“AS CONTAS DE GESTÃO DE CONVÊNIO

No caso de prestação de contas em razão de convênio celebrado entre os entes da Federação, a situação é bem diferente. A Lei Básica Federal impõe a qualquer pessoa jurídica de direito público que gerencie recursos da União o correspondente dever de prestar contas (art. 70, parágrafo único); estabelece também que compete ao Tribunal de Contas da União fiscalizar a aplicação de recursos repassados voluntariamente pela União a outro ente federado (art. 71, VI), bem como o julgamento das contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário federal (CF, art. 71, II, in fine).

Por conseguinte, a efetivação de transferência voluntária de recursos federais para determinado município, por exemplo, coloca o convenente na posição de devedor de contas à União. Esse fato não elide a responsabilidade pessoal do respectivo gestor público municipal perante a União pela boa aplicação dos tais recursos. Importa lembrar que os valores transferidos voluntariamente não se incorporam ao patrimônio do ente beneficiado imediatamente; isso só acontecerá quando o Tribunal de Contas da União julgar as contas referentes à administração do órgão/entidade repassador dos recursos (e não quando ocorrer aprovação das contas de convênio pelo órgão/entidade repassador) ou, quando for o caso, o Tribunal emitir julgamento da tomada de contas especial pela regularidade.” (FURTADO, José de Ribamar Caldas Furtado. Os regimes de contas públicas: contas de governo e contas de gestão. REVISTA DO TCU 109. MAIO/AGOSTO 2007. p. 61-89. Consultado em 12.08.2020, In: https://revista.tcu.gov.br/ojs/index.php/RTCU/article/view/438

Portanto, as contas de governo (anuais) e de gestão, prestadas pelo gestor municipal anualmente perante o Tribunal de Contas, e julgadas pelo Poder Legislativo municipal, não se confundem com as contas devidas em razão da assunção de responsabilidade, pelo gestor municipal, na regularidade quanto a aplicação de recursos públicos de titularidade de outros entes federados, em relação aos quais, ao formalizar Convênio, assume a obrigação não apenas de bem aplicar o dinheiro, bens e valores públicos repassados, mas também de prestar as correlatas contas ao órgão competente: o Tribunal de Contas responsável pelo controle da regularidade na utilização dos recursos recebidos.

A apreciação da regularidade da aplicação desses bens e valores públicos de titularidade de ente federado diversos estão portanto, e nos termos dos dispositivos constitucionais acima reproduzidos, sujeitas ao julgamento pelos Tribunais de Contas responsáveis pela apreciação das contas do ente repassador dos recursos.

Esse é o entendimento unânime e reiterado do Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, emanado inclusive posteriormente ao julgado do Supremo Tribunal Federal apontado pelo recorrente como paradigma:

“RECURSOS ESPECIAIS. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS. CONVÊNIO ENTRE MUNICÍPIO E UNIÃO. RECURSOS FEDERAIS. COMPETÊNCIA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. REPERCUSSÃO GERAL DEFINIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE 848.826/CE E 729.744/MG). NÃO INCIDÊNCIA. MATÉRIA DE FUNDO. CONTAS INTEMPESTIVAS. APLICAÇÃO DE RECURSOS. REGULARIDADE. AUSÊNCIA DE DOLO. MANUTENÇÃO DO REGISTRO. DESPROVIMENTO. (…)
Competência para Julgamento das Contas
7. O c. Supremo Tribunal Federal definiu tese, com repercussão geral, de que a competência para julgar contas prestadas por chefe do Poder Executivo municipal é da respectiva Câmara, nos termos do art. 31 da CF/88 (RE 848.826/CE e 729.744/MG, em 17.8.2016).
8. A matéria foi apreciada sob temática de contas de gestão versus contas de governo, sendo incontroverso que ambas compreenderam, naquela hipótese, recursos do erário municipal. O caso dos autos, ao contrário, versa sobre ajuste contábil envolvendo verbas oriundas de convênio com a União.
9. Assim, a posição externada pela c. Suprema Corte não alberga a hipótese sob julgamento. Aplica-se o art. 71, VI, da CF/88, segundo o qual compete ao Tribunal de Contas da União “fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município”, preservando-se, por conseguinte, o protagonismo que sempre pautou a atuação do órgão de contas.
10. Estender a tese de repercussão geral aos casos de convênio entre municípios e União ensejaria incongruência, porquanto o Poder Legislativo municipal passaria a exercer controle externo de recursos financeiros de outro ente federativo.
11. Mantido, portanto, o entendimento desta Corte Superior acerca da competência do Tribunal de Contas da União em casos como o dos autos.” (TSE – RESPE Nº 4682 (REspe) – PI, Ac. de 29/09/2016, Relator(a) Min. Herman Benjamin)

“ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO ELEITO. COLIGAÇÃO ITAPEVA NO RUMO CERTO – PDT/PTB/PTN/PSC/PR/PPS/DEM/PRTB/PSB/PV/PRP/PSDB/PSD/ SD. DEFERIDO. INELEGIBILIDADE. ART. 1o, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR No 64/1990. CONTAS RELATIVAS AO FUNDEB. TRIBUNAL DE CONTAS. ÓRGÃO COMPETENTE PARA O JULGAMENTO. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NOS RE’s Nos 848.826 E 729.744. INAPLICABILIDADE. CONTAS RELATIVAS A CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE INSANÁVEL. REEXAME DE FATOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA ANÁLISE DO PRONUNCIAMENTO DO TCE.
1. Rejeição de contas por possível irregularidade na aplicação de recursos repassados pela União ou pelo Estado (FUNDEB). Competência do Tribunal de Contas e não da Câmara de Vereadores. Inaplicabilidade do entendimento firmado pela Suprema Corte no julgamento dos REs nºs 848.826 e 729.744. Precedentes. Necessário o retorno dos autos à origem para o exame do pronunciamento exarado pelo TCE/SP, com vista à aferição da presença, ou não, da inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/1990.
2. Rejeição de contas de consórcio intermunicipal com expresso afastamento, pelo Tribunal de Contas, de irregularidade insanável. Situação reconhecida nas instâncias ordinárias. Modificar tal entendimento e concluir pela ocorrência da inelegibilidade exigiria reexame de fatos e provas vedado pela Súmula no 24/TSE. Recurso especial eleitoral a que se dá provimento parcial para, afastado o óbice oposto na origem – ausência de deliberação negativa da Câmara dos Vereadores -, determinar o retorno dos autos ao TRE/SP para novo julgamento quanto às contas supostamente referentes a recursos do FUNDEB.” (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 72621, Acórdão, Relator(a) Min. Rosa Weber, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico de 11/04/2017) (grifei)

“ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSOS ESPECIAIS. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO. PREFEITO E VICE-PREFEITO. OFENSA AO ART. 275 DO CÓDIGO ELEITORAL. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 1o, § 1o, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR No 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS. RECURSOS ORIUNDOS DE CONVÊNIOS FIRMADOS ENTRE MUNICÍPIO E SECRETARIAS DE ESTADO. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ÓRGÃO COMPETENTE. PRECEDENTES. OMISSÃO DO DEVER DE PRESTAR CONTAS. IRREGULARIDADE INSANÁVEL CONFIGURADORA DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INELEGIBILIDADE CONFIGURADA. INDEFERIMENTO DO REGISTRO MANTIDO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O art. 1°, I, g, da LC n° 64/90 contempla, em seu tipo, seis elementos fático- jurídicos como antecedentes de sua consequência jurídica, a serem, cumulativamente, preenchidos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento do órgão competente; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas.
2. A Justiça Especializada Eleitoral detém competência constitucional e legal complementar para aferir, in concrecto, a configuração de irregularidade de cariz insanável, ex vi do art. 14, § 9º, da CRFB/88 e art. 1°, I, g, da LC n° 64/90, bem como examinar se aludido vício qualifica-se juridicamente como ato doloso de improbidade administrativa (AgR-REspe n° 39-64/RN, de minha relatoria, DJe de 21.9.2016; RO n° 884-67/CE, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 14.4.2016; RO n° 725-69/SP, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 27.3.2015).
3. Aos Tribunais de Contas compete julgar contas de Prefeito referentes a convênios firmados com a União ou com outros entes federativos, e não apenas emitir parecer opinativo, a teor do art. 71, VI, da Constituição. Precedentes: REspe n° 140-75/BA, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 27.3.2017; AgR-REspe no 44-74/GO, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 6.5.2013; AgR-REspe no 134-64/PE, Rel. Min. Arnaldo Versiani, PSESS em 6.11.2012; e AgR-REspe no 218-45/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, PSESS em 25.9.2012.
4. A omissão do dever de prestar contas, prevista no art. 11, VI, da Lei n° 8.429/92, constitui falha insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, apta a atrair a incidência da inelegibilidade do art. 1o, I, g, da LC n° 64/90. Precedentes: AgR-REspe n° 88-56/AP, Rel. Min. Herman Benjamin, PSESS em 4.10.2016; REspe n° 24-37/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, PSESS em 29.11.2012; e AgR-REspe n° 101- 62/RJ, Rel. Min. Arnaldo Versiani, PSESS em 6.11.2012.
5. A responsabilidade pela omissão no dever de prestar contas é do mandatário em cuja gestão fora celebrado e implementado convênio, mesmo que a multa tenha sido aplicada apenas ao seu sucessor. Precedente: AgR-REspe n° 64060/SP, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 19.6.2013.” (TSE – RESPE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 19078 – PIRAPORA DO BOM JESUS – SP. Acórdão de 07/12/2017. Relator(a) Min. Luiz Fux. DJE – Diário de justiça eletrônico de 01/03/2018) (grifei)

“ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA AO CARGO DE VEREADOR INDEFERIDO PELO TRE DE MINAS GERAIS, REFORMANDO-SE A DECISÃO DE 1o GRAU. CONDENAÇÃO DO CANDIDATO PELO TCU, EM ÂMBITO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL, POR IRREGULARIDADES NA APLICAÇÃO DE RECURSOS PROVENIENTES DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) REPASSADOS AO MUNICÍPIO, EM PERÍODO NO QUAL EXERCEU O CARGO DE PREFEITO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE CONTAS PARA JULGAR AS CONTAS DE PREFEITO QUE ENVOLVEM CONVÊNIO E VERBAS FEDERAIS (PRECEDENTES: REspe 46-82/PI, REL. MIN. HERMAN BENJAMIN, PUBLICADO NA SESSÃO DE 29.9.2016; Respe 726-21/SP, REL. MIN. ROSA WEBER, DJe 11.4.2017). INCIDÊNCIA DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE CONSTANTE DA ALÍNEA G DO INCISO I DO ART. 1o DA LC 64/90, PELA PRESENÇA DE IRREGULARIDADE INSANÁVEL QUE CONFIGURA ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECISÃO DO TRE DE MINAS GERAIS EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE ELEITORAL. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. In casu, o TRE Mineiro indeferiu o Registro de Candidatura de SEBASTIÃO CARRARA DA ROCHA ao cargo de Vereador, ante a incidência da inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1o da LC 64/90, haja vista a sua condenação pelo TCU, na condição de ex-Prefeito de Carangola/MG, por irregularidades na aplicação de recursos do SUS repassados ao Município.
2. O colendo STF definiu tese, com repercussão geral, de que a competência para julgar as contas prestadas por Chefe do Poder Executivo Municipal é da respectiva Câmara, nos termos do art. 31 da CF/88 (RE 848.826/CE e 729.744/MG, em 17.8.2016). Entretanto, o TSE, em recente julgado, na linha da orientação do STF, assentou que o entendimento externado pela Corte Constitucional não alberga as contas prestadas por Prefeito referentes a recursos que derivem de convênio firmado entre Municípios e a União (REspe 46-82/PI, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, publicado na sessão de 29.9.2016).
3. Recentemente, este Tribunal Superior decidiu que a competência para julgar as contas que envolvem a aplicação de recursos repassados pela União ou pelo Estado aos Municípios é o Tribunal de Contas competente, e não da Câmara de Vereadores (REspe 726-21/SP, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 11.4.2017).
4. Não procede a alegação de que haveria divergência jurisprudencial entre o acórdão recorrido e o julgamento proferido por esta Corte no ED-RO 448-80/SE, de relatoria da eminente Ministra LUCIANA LÓSSIO. Isso porque, nesse julgado, ao contrário do que defende o recorrente, essa questão não restou pacificada, uma vez que a Ministra Relatora se limitou a prestar alguns esclarecimentos sobre a matéria como obiter dictum, já que nem o Ministério Público nem o TCE/SE trouxeram qualquer análise quanto ao vício atinente ao FUNDEF.
5. Para configurar, a inelegibilidade da alínea “g” do inciso 1 do art. 11 da LC 64/90, com a redação dada pela LC 135/10, são necessários os seguintes requisitos cumulativos (a) rejeição das contas relativas ao exercício de cargo ou função pública (b) por decisão irrecorrível, (c) proferida pelo órgão competente, (d) em razão de irregularidade insanável (e) que configure ato doloso de improbidade administrativa, e (O ausência do decurso do prazo de 8 anos de inelegibilidade, contado da publicação da decisão (000450-02.2016.6.13.0069 (TSE – RESPE – Recurso Especial Eleitoral nº 45002 – CARANGOLA – MG. Acórdão de 29/06/2017. Relator(a) Min. Napoleão Nunes Maia Filho. DJE – Diário de justiça eletrônico de 21/08/2017, Página 126-127).

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS. FUNDOS MUNICIPAIS. COMPETÊNCIA. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. FALHAS GRAVES E INSANÁVEIS. CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO. 
1. Registro da agravante – candidata não eleita ao cargo de deputado estadual pelo Maranhão nas Eleições 2018 – indeferido pela incidência de inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC 64/90, segundo o qual são inelegíveis, para qualquer cargo, “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando–se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”. 
2. O Tribunal de Contas do Estado do Maranhão – cuja competência no caso decorre do repasse de verbas estaduais para o Município – julgou irregulares contas relativas a fundos municipais dos exercícios financeiros de 2009 (FMAS, FUNDEB e FMS) e 2011 (FMS), figurando a candidata, ex–Prefeita de São João do Soter/MA, como ordenadora de despesas. 
3. As teses firmadas pelo STF no julgamento dos Recursos Extraordinários 848.826/DF e 729.744/DF – quanto a ser competente a Câmara para julgar contas anuais e de gestão de prefeito – aplicam–se apenas às hipóteses envolvendo recursos oriundos da própria municipalidade. Precedentes. 
4. A competência constitucional para fiscalização do patrimônio público adota como critério a origem dos recursos (municipal, estadual e federal) e não o instrumento do repasse (lei, convênio, termo de ajuste, contrato, termo de parceira etc.). Precedentes. 
5. Nos termos da jurisprudência desta Corte, condutas que gerem dano ao erário atraem a inelegibilidade da alínea g, dentre as quais: gastos sem licitação, ausência de prova de recolhimento das contribuições previdenciárias retidas e, ainda, fragmentação indevida de despesas com aquisição de medicamentos, com imputação de débito de R$ 14.510,45 e de seis multas no valor total de R$ 21.451,04. 6. Agravo regimental desprovido. (TSE – Recurso Ordinário nº 060083961, Acórdão, Relator(a) Min. Jorge Mussi, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 20/11/2018)

Na linha da jurisprudência do TSE, compete ao Tribunal de Contas da União fiscalizar e julgar as prestações de contas de prefeito relativas a convênio que envolve repasses de recursos federais ao município (CF, art. 71, VI), e às Cortes de Contas estaduais fiscalizar e julgar as prestações de contas de convênio relativas a repasses de recursos estaduais.

Compete apenas à Câmara de Vereadores a palavra final quando do julgamento das contas de  aplicação envolvendo recursos exclusivamente municipais. Vejamos

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO ELEITO (COLIGAÇÃO A MUDANÇA QUE VOCÊ CONHECE). INDEFERIDO. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/1990. CONTAS DE CONVÊNIO. VERBAS EXCLUSIVAS DO MUNICÍPIO. COMPETÊNCIA. JULGAMENTO. CÂMARA DE VEREADORES. PROVIMENTO. (…)
Da não configuração da inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990 
5. Consoante decidido por este Tribunal Superior ao exame do REspe nº 45-03/SP, Rel. Min. Henrique Neves, em sessão de 15.12.2016, a competência para julgamento das contas de convênio envolvendo recursos exclusivamente municipais é da Câmara de Vereadores, uma vez que, nessas hipóteses, não há repasse de recursos oriundos de outros entes da federação, a caracterizar ato de gestão. 
6. A alegação de que a própria Câmara Municipal de Hortolândia teria se eximido de apreciar os atos do Executivo local, por si só, não afasta a compreensão externada por este Tribunal Superior, ao qual compete, em última análise, aferir os requisitos necessários à incidência do disposto no art. 1º, I, g da LC nº 64/1990, no que se inclui a competência da Câmara Legislativa para julgamento de atos típicos de gestão dos prefeitos, como na hipótese. 
7. Não incidência, na espécie, da hipótese de inelegibilidade prevista na alínea g do art. 1º, I, da LC nº 64/90, ante a ausência de decisão irrecorrível proferida pelo órgão competente. Conclusão 8. Recurso especial provido para restabelecer a sentença pelo deferimento do registro de candidatura de Angelo Augusto Perugini ao cargo de prefeito de Hortolândia/SP nas eleições de 2016, prejudicada a AC nº 0602895-17. 2016.6.00.0000. (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 16980, Acórdão, Relator(a) Min. Rosa Weber, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 98, Data 18/05/2018, Página 75/76)

O posicionamento unânime do Tribunal Superior Eleitoral evidencia não apenas o pleno acolhimento da orientação fixada pelo E. Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 848.826, reconhecendo a competência exclusiva das Câmaras Municipais para julgar as contas dos Chefes de Executivo Municipais, mas demonstra que tal orientação não é aplicável à apreciação da regularidade na aplicação de recursos de outros entes federados, recebidos por exemplo, mediante a formalização de convênios, situações essas que, por força de mandamento constitucional expresso, chamam à atuação o Tribunal de Contas responsável pelo controle da regularidade daqueles recursos que foram repassados.

De fato, faltaria legitimidade à Câmara de Vereadores para apreciar e julgar a aplicação de recursos financeiros que não sejam da titularidade do próprio município que ela represente.

Por fim, destaca-se que o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco comunga do mesmo entendimento:

RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. INELEGIBILIDADE. LC Nº 64/90, ART, 1º, I, g. ALTERAÇÃO. LC Nº 135/2010. REJEIÇÃO DE CONTAS PÚBLICAS. TCU. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. DECISÃO IRRECORRÍVEL. AUSÊNCIA. REJEIÇÃO DE CONTAS. ÓRGÃO COMPETENTE. CÂMARA MUNICIPAL. CONCESSÃO. REGISTRO. DEFERIMENTO.
1. A despeito da ressalva final constante da nova redação do art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, a competência para o julgamento das contas de prefeito, sejam relativas ao exercício financeiro, à função de ordenador de despesas ou a de gestor, é da Câmara Municipal, nos termos do art. 31 da Constituição Federal;
3. Cabe ao Tribunal de Contas apenas a emissão de parecer prévio, salvo quando se tratar de contas atinentes a convênios, pois, nesta hipótese, compete à Corte de Contas decidir e não somente opinar.
4. Desprovimento. (TRE/PE – Recurso Eleitoral n 1519, ACÓRDÃO de 22/08/2012, Relator(aqwe) CARLOS DAMIÃO PESSOA COSTA LESSA, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 22/08/2012)

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *