Provavelmente temos uma nova decisão paradigmática do Tribunal Superior Eleitoral sobre a tolerância de valores aplicados irregularmente.
O TSE em dois julgamentos recentíssimos, fixou o seguinte entendimento:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. DESAPROVAÇÃO. PAGAMENTO DE DESPESAS SEM CONSTITUIÇÃO DE FUNDO DE CAIXA. IRREGULARIDADE GRAVE. PERCENTUAL ELEVADO. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para a superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto – até 1.000 (mil) Ufirs – ou percentual inexpressivo – até 10% do total da arrecadação ou despesa.
2. O valor das irregularidades detectadas nas contas analisadas supera a quantia de 1.000 (mil) Ufirs e corresponde a 43% do somatório das despesas de campanha, percentual que não se afigura proporcionalmente irrelevante e, por isso, ostenta gravidade capaz de macular a análise da regularidade das contas, descortinando–se possível a aprovação das contas com ressalvas.
3. Os argumentos expostos pelo agravante não são suficientes para afastar a conclusão da decisão agravada.
4. Agravo a que se nega provimento. (TSE – RESPE nº 060315749, Rel. Min. EDSON FACHIN, julgado em 15.10.2020, DJe de 23.10.2020)
Fundamentos do voto do relator para definir qual seria o valor diminuto:
“Nada obstante, considerando o conjunto de decisões deste Tribunal, impende balizar definição de valor diminuto que parametrize a aplicação desse conceito indeterminado, ocasionando a equiparação, sob o mesmo signo, de valores expressivamente diferentes em termos absolutos.
(…)
Uma vez que o legislador dispensa maior rigor na fiscalização sobre os gastos realizados em favor de candidaturas, desde que não excedam o total de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) – 1.000 (mil) Ufirs –, é possível concluir que esse valor é entendido como diminuto pela legislação eleitoral e, portanto, insuficiente para exigir o pleno rigor da análise da Justiça Eleitoral sobre as prestações de contas.
Diante desse quadro, entendo que as irregularidades encontradas em prestações de contas de campanhas de candidatos cujos valores absolutos não excedam a 1.000 (mil) Ufirs – R$ 1.064,10( mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) – devem ser consideradas irregularidades de valor diminuto e, portanto, inaptas per se a causarem a desaprovação das prestações de contas.”
Encontrado esse valor, o relator faz uma importante ressalva quanto verba oriunda de fonte vedada:
“Em relação às fontes vedadas de captação de recursos, realiza-se juízo de reprovabilidade da conduta independentemente do valor captado, de modo que a irregularidade revela-se imune ao conceito de valor diminuto.
Porque a reprovação da conduta recai sobre a sua própria natureza e indica o ingresso de verbas espúrias no processo eleitoral é que se revela inadmissível a aplicação do conceito de valor diminuto a essa espécie de irregularidade.”
Estabelecido o critério para a aplicação do conceito de valor diminuto, o relator passa para outro critério com base nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade:
“A jurisprudência desta Corte Superior entende possível a aplicação dos princípios nominados para a superação de irregularidades nas prestações de contas que não excedam o limite de até 10% do total da arrecadação ou das despesas, conforme a natureza da irregularidade.
Entendo que o limite de 10% adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.
Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, desnecessário aferir se é inferior a 10% do total da arrecadação ou despesa, devendo-se aplicar o critério do valor diminuto.
Apenas se superado o valor máximo absoluto tido como irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser ignorada a quantia de 1.000 (mil) Ufirs [R$ 1.064,10] alcançada pelo critério do valor diminuto.”
Em julgado ainda mais recente, o TSE reafirmou esse posicionamento, vejamos:
ELEIÇÕES 2016. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATA A PREFEITA. DESAPROVAÇÃO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. POSSIBILIDADE. ART. 36, § 7º, DO RITSE. FALHAS DETECTADAS QUE SÃO PEQUENAS NO CONJUNTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS DAS CONTAS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. O art. 36, §§ 6º e 7º, do RITSE autoriza o relator decidir, monocraticamente, os recursos que lhe são distribuídos com fundamento na compreensão jurisprudencial dominante no Tribunal Superior Eleitoral.
2. A aplicação dos princípios da insignificância, da proporcionalidade e da razoabilidade permite a superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto ou percentual inexpressivo. Precedentes.
3. A superação do o limite de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), valor máximo absoluto entendido por diminuto, permite a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades é inferior a 10% do total da arrecadação ou da despesa, autorizando a aprovação das contas com ressalvas.
4. Na espécie, extrai–se do quadro fático delineado no acórdão regional que as falhas apuradas somam R$ 13.790,72 (treze mil, setecentos e noventa reais e setenta e dois centavos), correspondentes a menos de 5,00% das despesas contratadas na campanha, valor que se afigura diminuto em termos percentuais, autorizando a aprovação das contas com ressalvas, à luz da compreensão jurisprudencial desta Corte Superior. Inexistentes, ainda, circunstâncias qualitativas capazes de inviabilizar a incidência dos aludidos princípios no caso concreto.
5. Agravo interno a que se nega provimento. (TSE – Agravo de Instrumento nº 30465, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 22.10.2020, DJE de 03.11.2020)