O servidor que cometeu crime contra a administração pública pode ser proibido de voltar ao serviço, mas deve haver a definição de um prazo relativamente determinado sobre o retorno. A medida é necessária para atingir a proteção ao interesse público, sem impor sanção perpétua.
Com esse entendimento, a maioria do Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional trecho da Lei 8.112/90. No parágrafo único do artigo 137, a lei proíbe o retorno ao serviço público do servidor federal ocupante de cargo em comissão que for demitido ou destituído da função por prática de crime contra a administração pública, atos de improbidade, corrupção, entre outros.
A ação foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República em 2003. Segundo o PGR, o dispositivo não estabelece prazo para o fim da proibição, estando aí sua inconstitucionalidade. De acordo com o artigo 5º, XLVII, “b” da Constituição Federal, “toda pena há de ser temporária, conforme dispuser a lei”.
O colegiado concordou em comunicar a decisão ao Congresso para que avalie se vai deliberar sobre o prazo de proibição de retorno ao serviço público.
A maioria dos ministros seguiu o relator, ministro Gilmar Mendes, para quem a proibição prevista na lei não trata de requisitos gerais de habilitação e acesso a cargos, mas sim de “punição, retribuição pela prática de fatos considerados graves no exercício de cargos em comissão”.
Apontando a doutrina internacional sobre a aplicação extensiva de sanções penais às normas administrativas, o ministro afirmou que “não resta dúvida de que o dispositivo atacado é inconstitucional por violação à proibição de imposição de sanção perpétua”.
A proibição de retorno ao serviço público, disse, “constitui restrição à liberdade submetida ao terceiro nível de intensidade, razão pela qual deve ser submetida a um escrutínio mais intenso por parte desta Corte”.
Supressão mais perigosa
Foram abertas três correntes de divergência. Luís Roberto Barroso defendeu que a declaração de inconstitucionalidade da lei pode gerar mais danos para o sistema do que a sua preservação temporária. O ministro concorda com o relator no sentido de que a proibição de retorno ao serviço público, sem qualquer prazo, “constitui restrição desproporcional à liberdade”.
Mas pondera que a intenção do legislador foi a proteção do interesse público. “De modo que a declaração de nulidade permitirá o imediato retorno ao serviço público federal de servidores demitidos ou destituídos de cargo em comissão”, afirmou.
Sobre a regulamentação do tema pelo Congresso, fez a ressalva de que não há prazo para que os parlamentares deliberem sobre o tema, nem obrigatoriedade de que isso seja feito.
Por isso, votou para julgar a ação parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade do trecho da norma, mas sem a pronúncia de nulidade. Barroso concordou em acenar ao Congresso para analisar a matéria, mas estabelecendo “prazo não inferior a 5 anos em relação ao retorno ao serviço público”. Seu voto foi seguido por Nunes Marques.
Decano, o ministro Marco Aurélio divergiu apenas quanto à comunicação ao Legislativo que, segundo ele, “é passo demasiado largo”. O ministro defende não caber ao Supremo “estabelecer prazo ou rogar a atuação do Legislativo, sob pena de desgaste maior”.
Estrutura administrativa
Luiz Edson Fachin entendeu que a proibição de servidor demitido ou destituído de cargo “configura mais um dos diversos requisitos de investidura em cargo público”. Segundo o ministro, a lei não ofende ao artigo 5º, XLVII, “b”, da Constituição, conforme alegou o PGR.
“Ainda que se entenda pela aplicação dos princípios de Direito Penal no âmbito do Direito Administrativo sancionador, o dispositivo impugnado não importa em pena ou sanção ao servidor pela ilicitude cometida”, explicou o ministro.
De acordo com Fachin, a norma trata de “uma condição para exercício de cargo, tal quais são as vedações ao nepotismo, inexistência de antecedentes criminais, qualificação profissional, entre outros”. “Não se trata de penalidade ou sanção a pessoa, pois não há direito subjetivo ao exercício de cargos em comissão”, afirmou. Rosa Weber acompanhou seu voto, julgando improcedente a ação.
O julgamento aconteceu em Plenário Virtual e encerrou na última sexta-feira (4/12).
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ADI 2.975