Impedimento de licitar com o poder público é restrito ao órgão sancionador, esclarece TCE-PR

A suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração, por prazo não superior a dois anos, em razão da inexecução total ou parcial de contrato firmado com o poder público está restrita ao âmbito do órgão ou entidade estatal sancionadora. Portanto, deve ser adotada a interpretação restritiva quanto à extensão dos efeitos da penalidade estabelecida pelo artigo 87, inciso III, da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos).

Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada em 2019, pelo então presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, desembargador Adalberto Jorge Xisto Pereira. Na consulta, o TJ-PR questionou se a interpretação adotada em relação à extensão dos efeitos das penalidades estabelecidas pelo artigo 87, III, da Lei nº 8.666/93 deveria ser restritiva ou ampliada.

Instrução do processo

O parecer jurídico do TJ-PR lembrou que tem prevalecido, na doutrina e na jurisprudência, que os efeitos da penalidade questionada devem ser restritos ao âmbito daquele órgão ou entidade que aplicou a penalidade. Além disso, afirmou que decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) e do TCE-PR consolidam esse entendimento, com a permissão da participação de licitantes em órgãos ou entidades diversos daquele que aplicou a sanção.

A Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca (SJB) do TCE-PR informou a resposta à Consulta nº 26357/19 (Acórdão nº 156/19 – Tribunal Pleno) trata de tema correlato ao questionamento do consulente.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) entendeu que deve ser adotada a interpretação restritiva quanto à extensão da penalidade, pois as decisões do Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário não levam em consideração a legislação do Estado do Paraná que disciplina a matéria; foram proferidas em processos não vinculantes, de modo que não sujeitam os demais órgãos do Poder Judiciário e os demais Tribunais de Contas; e refletem julgamentos isolados, sem configurar, portanto, entendimento reiterado e consolidado em inúmeros processos.

Legislação e jurisprudência

O inciso XI do artigo 6º da Lei nº 8.666/93 define administração pública como a administração direta e indireta da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas.

O artigo 87, III, da Lei nº 8.666/93 dispõe que, pela inexecução total ou parcial do contrato a administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado a suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração, por prazo não superior a dois anos.

A Lei Estadual nº 15.608/2007 (Lei Paranaense de Licitações e Contratos) estabelece normas sobre licitações, contratos administrativos e convênios no âmbito dos poderes do Estado do Paraná, com observância das normas gerais sobre a matéria, expedidas pela União.

Os incisos III e IV do artigo 150 dessa lei fixam que o candidato a cadastramento, o licitante e o contratado que incorram em infrações administrativas sujeitam-se às seguintes sanções administrativas: suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração, por prazo não superior a dois anos; e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública, por prazo não superior a cinco anos.

O inciso II do parágrafo único do artigo 154 dessa lei expressa o impedimento da participação da sancionada vale para procedimentos promovidos pela entidade estatal que a aplicou.

O artigo 155 da Lei Paranaense de Licitações e Contratos dispõe que quando o participante for punido com a sanção prevista no inciso III do seu artigo 150, durante o prazo de vigência de igual sanção imposta por pessoa da mesma esfera político-administrativa, ficará proibido de participar de procedimentos de contratação promovidos por todas as entidades estatais e órgãos do Estado, por prazo não superior ao maior prazo remanescente daquela anterior.

O Acórdão nº 902/2012 – Plenário do TCU expressa que “a previsão contida em edital de concorrência no sentido de que o impedimento de participar de certame em razão de sanção do artigo 87, III, da Lei nº 8.666/93 limita-se às empresas apenadas pela entidade que realiza o certame autoriza a classificação de proposta de empresa apenada por outro ente da administração pública federal com sanção do citado comando normativo, em face da inexistência de entendimento definitivo diverso desta Corte sobre a matéria”.

O Acórdão nº 2788/2019 – Plenário do TCU fixa que a sanção de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração, prevista no inciso III do artigo 87, III, da Lei nº 8.666/93, produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade contratante.

O Acórdão nº 156/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Processo nº 26357/19), refere-se à homologação de medida cautelar concedida monocraticamente no sentido de que a extensão da pena é restrita. Na análise definitiva de mérito desse mesmo processo – Acórdão nº 3175/19 – Tribunal Pleno -, o TCE-PR assentou o posicionamento restritivo.

O Acórdão nº 1942/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Processo nº 677665/19) fixa o entendimento de que a sanção de suspensão de participar de licitações se restringe à esfera de governo do órgão sancionador.

Decisão

O relator do processo, conselheiro Fabio Camargo, lembrou que a Lei Estadual nº 15.608/07 foi categórica ao dispor que o impedimento de contratar com a administração ficará restrito aos procedimentos promovidos pela entidade estatal que o aplicou. Ele entendeu que isso demonstra o caráter restritivo da sanção.

Assim, Camargo ressaltou que, embora exista discussão quanto à extensão da suspensão prevista pela Lei Geral de Licitações e Contratos, a norma estadual não permite essa margem interpretativa.

O conselheiro afirmou que, em suas recentes lições, o renomado doutrinador Marçal Justen Filho diferencia as penalidades de suspensão e declaração de inidoneidade; e aponta que a norma adotou a corrente restritiva para a suspensão e ampliativa para a inidoneidade.

O relator destacou que a suspensão ocorre perante a entidade sancionadora e a inidoneidade se estende a todos os órgãos da administração pública, nos termos do que prevê o artigo 6º da Lei nº 8.666/93. Camargo salientou, ainda, que recentemente o entendimento de membros do TCE-PR tem sido pela interpretação restritiva, com votos aprovados pelos demais julgadores, o que parece indicar a tendência de consolidação nesse sentido.

O conselheiro ressaltou que, em razão dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, deve-se considerar que a suspensão de licitar ou de contratar com a administração tenha os seus efeitos restritos àquele ente que a impôs e não à administração pública em seu sentido amplo.

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, por meio da sessão nº 15 do plenário virtual do Tribunal Pleno, concluída em 17 de dezembro passado. O Acórdão nº 3962/20 foi disponibilizado em 18 de janeiro, na edição nº 2.458 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC).

Leia o acórdão.

Processo : 445040/19
Acórdão nº 3962/20 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Tribunal de Justiça do Estado do Paraná
Interessado: Tribunal de Justiça do Estado do Paraná
Relator: Conselheiro Fabio de Souza Camargo
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