Inexiste, na Constituição de 1988, reserva de iniciativa para leis de natureza tributária, inclusive para as que concedam renúncia fiscal. Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a constitucionalidade de uma lei municipal de Valinhos, de iniciativa parlamentar, que concede isenção ou remissão do IPTU incidente sobre imóveis atingidos por enchentes e alagamentos.
A ADI foi movida pela prefeitura, que alegou violação ao princípio da separação dos poderes, especialmente por interferir na estrutura da Secretaria da Fazenda, criando e ampliando atribuições sem planejamento. Além disso, o município destacou a ausência de estudos orçamentários e previsão de recursos disponíveis.
No entanto, em votação unânime, o Órgão Especial julgou a ação improcedente. De acordo com o relator, desembargador João Carlos Saletti, a matéria tratada na lei impugnada, de ordem tributária, é concorrente entre os Poderes Executivo e Legislativo. Portanto, não há vício de iniciativa ou à reserva da administração, e nem ofensa ao princípio da independência e harmonia dos poderes.
“Sendo concorrente a iniciativa de projeto de lei tratando de matéria tributária, o mesmo ocorre, consequentemente, quanto à extensão de eventual benefício tributário, ao contrário do afirmado pelo proponente”, afirmou. O relator também afastou o argumento do município de que a lei seria inconstitucional por não haver estudo de impacto orçamentário, com diminuição da receita e sem indicação da fonte de custeio.
Isso porque, conforme o magistrado, a lei em questão não é orçamentária e não pode ser anulada apenas por acarretar diminuição da receita: “Não bastasse, a alegação de renúncia (de que não se trata, mesmo porque nada expressa a lei a respeito) ou diminuição de receitas (que de fato sucede, embora não se saiba em que medida), demanda análise de matéria de fato, o que é incabível nesta sede de ação direta de inconstitucionalidade. Aliás, estender o benefício de isenção não tem o caráter de renúncia de receita, malgrado resulte a perda dela, evidentemente”.
Processo relacionado: 2141404-10.2020.8.26.0000
NOTA DO ESCRITÓRIO
Vejamos a ementa do acórdão:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Alegação de violação de preceitos da Constituição Estadual, Constituição Federal e da Lei Orgânica Municipal – Descabimento – Parâmetro de controle de constitucionalidade de lei municipal perante Tribunal de Justiça é a norma constitucional estadual, apenas – Pretensão conhecida e julgada somente no respeitante às normas constitucionais estaduais, ditas contrariadas. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Lei nº 5.989, de 18 de maio de 2020, do Município de Valinhos, que “concede isenção ou remissão do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU incidente sobre imóveis edificados atingidos por enchentes e alagamentos no Município de Valinhos” – INICIATIVA LEGISLATIVA – Lei que não tratou de nenhuma das matérias de iniciativa legislativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo – Ausência de vício de iniciativa – Orientação traçada pelo STF na Tese 682 de Repercussão Geral no ARE 743.480-MG (“inexiste, na Constituição Federal de 1988, reserva de iniciativa para lis de natureza tributária, inclusive para as que concedam renúncia fiscal”) – RECEITA – Diminuição – Circunstância que não invalida a norma tributária, nem implica aumento de despesas – Não bastasse, a alegação de renúncia de receitas demanda análise de matéria de fato, o que é incabível em sede de ação direta de inconstitucionalidade – ART. 113 DO ADCT, INCLUÍDO PELA EC 95/2016 – Norma de caráter transitório que não se aplica aos Estados e Municípios, incluído pela Emenda Constitucional 95/2016, norma de caráter transitório e de não reprodução obrigatória – Dispositivos que não se referem aos Municípios, mas à União, por se tratar do “Novo Regime Fiscal no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União” – Precedentes – Inconstitucionalidade afastada. Preliminar afastada e ação julgada improcedente. (TJSP – Proc. nº 2141404-10.2020.8.26.0000; Rel. Des. João Carlos Saletti; Órgão Especial, julgado em 27.01.2021, data de registro: 28/01/2021)