É lícito ao Poder Legislativo instituir políticas públicas, desde que não invada o núcleo da reserva de iniciativa legislativa do chefe do Poder Executivo e da reserva da Administração.
O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao validar parte de uma lei de Itapecerica da Serra, de autoria parlamentar, que cria o programa Conecta Itap para instalação de wi-fi em praças, parques, pontos turísticos e todos os espaços públicos do município.
A ação foi proposta pela prefeitura da cidade com o argumento de que teria ocorrido invasão de competência de iniciativa de lei, reservada ao prefeito. Mas o relator, desembargador Costabile e Solimene, julgou a ação apenas parcialmente procedente.
Ele afirmou que a lei não pode ser considerada inconstitucional só porque, nos termos do artigo 2º, a Câmara de Vereadores buscou materializar uma política pública que está nacionalmente consagrada no artigo 7º do Marco Civil da Internet (Lei Federal 12.965, de 23/4/2014).
“Pode, sim, o Poder Legislativo estabelecer políticas públicas, porém, contudo, desde que respeite a delimitação constitucional de separação de poderes. A situação ficou bem esclarecida quando da edição da tese de repercussão geral, por ocasião do Tema 917 do Excelso Pretório”.
Do mesmo modo, o magistrado afirmou que o problema não está no que diz respeito à dotação orçamentária: “Sabido de todos que eventual ausência de recursos conduz à ineficácia do dispositivo, senão ao retardo de sua efetivação material, nunca, no entanto, sua inconstitucionalidade”.
Por outro lado, Solimene considerou que, em certos artigos, a lei impugnada contrariou o texto constitucional que prevê reservas para a iniciativa legislativa atribuída à Administração. Ele citou os artigos que permitem à prefeitura celebrar convênios ou contratos, incluindo parcerias público-privadas, para implantação do wi-fi.
“Observo de antemão não ter relevância o caráter meramente autorizador da lei impugnada, na medida em que o prefeito não precisa de autorização do Legislativo para o exercício de atos de sua exclusiva competência. Vale dizer, em verdade a norma impugnada contém indisfarçável ‘determinação'”, frisou Solimene.
Segundo ele, a imposição de obrigação ao Executivo resulta em indevida interferência na estrutura administrativa da prefeitura, em desatenção aos princípios da separação dos poderes e da reserva da Administração: “O Poder Legislativo não pode impor, sequer ‘autorizar’, o Poder Executivo a celebrar convênios e/ou parceria público-privadas. Tratam-se de atos de gestão, vale dizer, atribuição do próprio Executivo”.
Assim, o desembargador reconheceu a inconstitucionalidade dos artigos que tratavam de convênios e parcerias, incluindo a expressão “por intermédio de convênios e parcerias público-privadas (PPP)”. A decisão se deu por unanimidade.
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2232093-66.2021.8.26.0000