Trata-se de consulta formulada por prefeito municipal, por meio da qual indagou sobre a possibilidade de se utilizar os recursos recebidos à conta do FUNDEB em percentual superior a 5% no exercício imediatamente subsequente, em virtude do estado de calamidade pública provocado pela Covid-19 e seus efeitos, em face da descontinuidade do ensino presencial.
Preliminarmente, por unanimidade, a consulta foi admitida. No mérito, o relator, conselheiro Durval Ângelo, destacou que o §2° do art. 21 da Lei n. 11.494/2007, dispunha que os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) seriam utilizados no exercício em que fossem creditados, em ações consideradas como manutenção e desenvolvimento do ensino para a educação básica pública, sendo que até 5% de tais recursos poderiam ser utilizados no primeiro trimestre do exercício imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional. Salientou, todavia, que tal dispositivo foi revogado pelo § 3º do art. 25 da Lei n. 14.113/2020, de modo que, atualmente, o percentual de recursos que podem ser utilizados no exercício imediatamente subsequente foi ampliado para 10% e o período se estendeu ao quarto mês do ano subsequente.
O relator alertou que a possibilidade de utilização do percentual de recursos de até 10%, no primeiro quadrimestre do exercício imediatamente subsequente, é regra que se aplica apenas a partir do exercício de 2021. Nos termos do art. 53da Lei n. 14.113/2020, quanto aos efeitos financeiros no que se refere à execução dos Fundos relativa ao exercício de 2020, a regra que deve ser seguida é a do §2° do art. 21 da Lei n. 11.494/2007, que permite a utilização de até 5% dos recursos do Fundeb no primeiro trimestre do exercício imediatamente subsequente.
No mesmo sentido, o relator citou excerto do parecer exarado em resposta à Consulta 838953, segundo o qual “mesmo sendo transferido para o exercício seguinte, o saldo dos recursos não utilizados mantém sua natureza vinculativa, em obediência ao disposto no art. 8°, parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal, o qual estabelece que: “Os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objetivo da vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso”.
Sendo assim, respondeu ao questionamento positivamente, no sentido de que é possível utilizar os recursos recebidos à conta do FUNDEB, em percentual de até 10%, portanto superior a 5%, no exercício imediatamente subsequente, destacando que os arts. 9º e 19 da Instrução Normativa n. 2/2021, destinada a “regulamentar o cômputo das Despesas na Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) e a aplicação de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) pelo Estado e pelos municípios”, reiteram a previsão legal, que lastreia a resposta a esta Consulta.
Em sede de retorno de vista, o conselheiro Cláudio Couto Terrão, partindo da contextualização legal feita pelo relator, sugeriu a complementação do parecer, com a advertência de que várias normas foram publicadas desde março de 2020, quando da decretação do estado de calamidade pública decorrente da Covid-19, com o objetivo de estabelecer regimes excepcionais ou transitórios em certas áreas, de modo a adequar as normas gerais ao período de anormalidade vivenciado.
Não obstante, destacou que nenhuma delas utilizou tal fundamento para autorizar a extrapolação do limite previsto no §2° do art. 21 da Lei n. 11.494/2007, de 5% até o exercício de 2020, ou no § 3º do art. 25 da Lei n. 14.113/2020, de 10%, a partir do exercício de 2021, não havendo, portanto, previsão legal que autorize a utilização dos recursos do Fundeb no exercício subsequente em percentual superior ao fixado nessas normas, em virtude da calamidade pública decorrente da pandemia e da consequente suspensão das atividades de ensino presencial.
Com essas ponderações, o conselheiro Cláudio Couto Terrão aderiu à resposta proposta pelo relator, apenas agregando um item para incorporar à análise a circunstância da calamidade pública, trazida pelo consulente em sua indagação.
Ao final, o Tribunal Pleno aprovou o voto do relator, que encampou o voto-vista do conselheiro Cláudio Couto Terrão, ficando fixado prejulgamento de tese, com caráter normativo, no sentido de que:
1. É possível utilizar os recursos recebidos à conta do Fundeb, inclusive os relativos à complementação da União, a que se refere o § 2º do art. 16, da Lei n. 14.113/2020, em percentual superior a 5%, no primeiro quadrimestre do exercício imediatamente subsequente, até o limite de 10%, mediante abertura de credito adicional, a partir da execução dos Fundos do exercício de 2021;
2. Em razão do estabelecido no art. 53, da Lei n. 14.113/2020, quanto aos efeitos financeiros no que se refere à execução dos Fundos relativa ao exercício de 2020, a regra que deve ser seguida é a do §2° do art. 21, da Lei n. 11.494/2007, que permite a utilização de até 5% dos recursos do Fundeb no primeiro trimestre do exercício imediatamente subsequente;
3. Não há previsão legal que autorize a utilização dos recursos do Fundeb no exercício subsequente em percentual superior ao fixado no §2° do art. 21, da Lei n. 11.494/2007, de 5% até o exercício de 2020, ou no § 3º do art. 25, da Lei n. 14.113/2020, de 10% a partir do exercício de 2021, em virtude da calamidade pública decorrente da pandemia e da consequente suspensão das atividades de ensino presencial.
Processo 1095567 – Consulta. Rel. Cons. Durval Ângelo. Tribunal Pleno. Deliberado em 06/04/2022)