Em consulta, TCE-PR esclarece possibilidade de concessão de auxílio-alimentação

Não é obrigatório o fornecimento de refeição no local de trabalho a servidores municipais ou temporários. Como tem autonomia política e administrativa, o município pode estabelecer, por meio de lei, o pagamento de auxílio-alimentação ou o fornecimento direto de refeições aos servidores públicos efetivos e temporários. Para tanto, é imprescindível a existência de dotação orçamentária; e devem ser observadas as disposições da Constituição Federal (CF/88) e da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF).

Mas é indevida a previsão de ambas as medidas concomitantemente, o que seria antieconômico e com desvio de finalidade. Em relação aos empregados terceirizados, cabe ao empregador contratado pelo município realizar o pagamento de auxílio-alimentação ou o fornecimento direto de refeição aos funcionários, na forma estabelecida pela legislação trabalhista, inclusive em convenção coletiva de trabalho, cujas normas são de observância obrigatória para a formulação de proposta em licitação.

O município pode optar por fornecer diretamente refeições aos terceirizados que não possuem direito ao benefício de auxílio-alimentação, desde que haja previsão na legislação. Mas não é possível substituir o benefício de auxílio-alimentação fixado em norma trabalhista pelo fornecimento direito, pois esse auxílio é um direito dos trabalhadores e o município não tem competência para legislar sobre direito do trabalho.

Essa é a orientação do Pleno do TCE-PR, em resposta à Consulta formulada pela prefeita do Município de Itaipulândia em 2022, sobre a possibilidade de fornecimento de refeição no local de trabalho aos servidores municipais, servidores temporários e empregados contratados mediante contrato de terceirização de mão de obra.

Instrução do processo

A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR ressaltou a necessidade de atendimento ao princípio da legalidade estrita. Assim, opinou pela possibilidade de fornecimento de auxílio-alimentação ou refeições no local de trabalho aos servidores públicos efetivos e temporários, e empregados terceirizados, desde que haja previsão legal.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou com a instrução técnica; e defendeu a natureza indenizatória do auxílio-alimentação, motivo pelo qual a despesa não deve ser incluída no cômputo de despesas de pessoal, já que não está prevista no artigo 18 da LRF.

O órgão ministerial destacou que, além de previsão legal e dotação orçamentária, é necessária a demonstração da origem dos recursos para custeio dessa despesa obrigatória de caráter continuado.

Legislação e doutrina

O inciso IX do artigo 37 da CF/88 dispõe que a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

O inciso seguinte (XXI) desse artigo estabelece que, ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

O artigo 39 do texto constitucional expressa que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

O parágrafo 1º do artigo 169 da CF/88 dispõe que a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; e se houver autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

O artigo 16 da LRF fixa que a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; e da declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a Lei Orçamentária Anual (LOA) e compatibilidade com o Plano Plurianual e com a LDO.

O artigo 17 da LRF considera obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

O artigo seguinte (18) da LRF expressa que se entende como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

O inciso II do parágrafo 2º do artigo 7º da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos) dispõe que as obras e os serviços somente poderão ser licitados quando existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários.

O inciso I do artigo 58 da Lei de Licitações e Contratos estabelece que o regime jurídico dos contratos administrativos confere à administração, em relação a eles, a prerrogativa de modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado. O parágrafo 2º desse artigo fixa que, nesse caso, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.

O Acórdão nº 2387/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 347037/18) dispõe que a LRF define a despesa total com pessoal como o somatório dos gastos dos entes federados com “quaisquer espécies remuneratórias”, ficando excluídas, portanto, as espécies indenizatórias; e que o artigo 2º do Decreto nº 3.887/01, que regulamenta o auxílio-alimentação no âmbito da União, determina o caráter indenizatório desse benefício. Portanto, o auxílio-alimentação não deve ser computado no índice de despesas com pessoal.

O Acórdão nº 2797/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 179529/19) reforça o entendimento de que o auxílio-alimentação tem natureza jurídica indenizatória; e sua instituição deve ser realizada por meio de lei. Também fixa que a norma que instituir esse benefício deve disciplinar se o seu pagamento será efetuado diretamente pela administração, por meio do crédito na folha salarial, ou indiretamente, por meio da contratação de empresa especializada na gestão de cartões, tíquetes e outros.

Esse acórdão estabelece, ainda, que, caso a legislação indique a terceirização do serviço, a contratação deverá ser objeto de licitação, em observância às disposições do artigo 37, XXI, da Constituição Federal (CF/88) e da Lei n° 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos).

Ainda de acordo com essa resposta a Consulta, a concessão do auxílio-alimentação depende de autorização orçamentária – parágrafo 1º do artigo 169 da CF/88 -, com dotação específica na LOA e previsão na LDO. Além disso, devem ser observadas as disposições dos artigos 16 e 17 da LRF, sob pena de responsabilização pessoal do gestor pelo seu descumprimento.

Por meio do acórdão nº 2046/19 – Tribunal Pleno (Consulta nº 670373/17), o TCE-PR decidiu que o auxílio-alimentação tem natureza indenizatória e não deve ser computado em face do limite de gastos de pessoal.

O acórdão nº 2415/17 – Tribunal Pleno (Consulta nº 959384/15) do TCE-PR expressa que a concessão do auxílio-alimentação depende de previsão legal e de disponibilidade orçamentária.

O Tribunal de Justiça do Paraná já manifestou o entendimento de que eventual concessão de benefícios aos seus servidores depende de expressa previsão legal.

Decisão

O relator do processo, conselheiro Augustinho Zucchi, lembrou que os servidores do município estão sujeitos ao regime jurídico específico da categoria. Ele frisou que, conforme previsão constitucional, a instituição do regime jurídico e dos planos de carreira dos servidores públicos, que abrangem a remuneração e demais benefícios, está sujeita ao princípio da reserva legal.

Portanto, o conselheiro ressaltou que cabe aos municípios, que têm autonomia administrativa, regulamentar a previsão e a forma de disponibilização do benefício, seja por meio de auxílio-alimentação ou pelo fornecimento de refeições diretamente.

Zucchi frisou que, além do respeito ao princípio da reserva legal, é necessário que haja previa dotação orçamentária e autorização específica na LDO para a criação de qualquer dos benefícios. Ele também destacou a necessidade de observância das disposições dos artigos 16 e 17 da LRF, para garantia do equilíbrio fiscal.

O relator afirmou, ainda, que a cumulação dos benefícios configuraria desvio de finalidade de uma das medidas, já que a alimentação atendida pelo fornecimento direto implicaria aumento da remuneração em relação a eventual auxílio fornecido.

O conselheiro ressaltou que, atualmente, é comum a previsão de benefício voltado à alimentação do trabalhador em norma coletiva de trabalho, o que torna obrigatório o seu fornecimento pela empresa e representa um custo a ser pago pelo ente público contratante. Ele lembrou que a Lei nº 8.666/93 obriga a existência de planilha de composição de custos unitários para a contratação de serviços; e que os custos decorrentes da inclusão do benefício devem ser ajustados para manutenção das condições efetivas da proposta em licitação e a preservação do equilíbrio econômico-financeiro.

Finalmente, Zucchi ressaltou que o fornecimento direto de alimentação pelo município para empregados terceirizados é possível apenas se não houver direito ao auxílio alimentação e existir previsão legal, pois nesta hipótese não haveria substituição de direito trabalhista, mas acréscimo de um benefício aos trabalhadores, de acordo com a autonomia municipal.

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, por meio da Sessão nº 16/23 do Plenário Virtual do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 31 de agosto. O Acórdão nº 2761/23 – Tribunal Pleno foi disponibilizado em 6 de setembro na edição nº 3.059 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC).

Serviço

Processo :

298886/22
Acórdão nº 2761/23 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Itaipulândia
Interessados: Cleide Inês Griebeler Prates e Lindolfo Martins Rui
Relator: Conselheiro Augustinho Zucchi
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