A execução fiscal é cabível para cobrar multas civis por atos de improbidade administrativa, desde que acompanhada da CDA, e a Fazenda Pública lesada é o exequente legítimo

Cinge-se a controvérsia em saber se é cabível a execução fiscal para cobrança de multa aplicada em sentença de improbidade administrativa e se o ente público lesado possui legitimidade ativa para propor tal execução.

A execução fiscal consiste na execução judicial para a cobrança da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias, disciplinada pela Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF), a ser necessariamente instruída com a Certidão de Dívida Ativa – CDA.

A CDA, a seu turno, é proveniente de um procedimento administrativo denominado inscrição em dívida ativa, consistente no controle administrativo da legalidade, a fim de apurar a liquidez e a certeza do crédito – tributário ou não tributário – definido na Lei n. 4.320/1964, no âmbito de uma relação jurídica de direito público.

Segundo a intelecção que se extrai do art. 2º, § 2º, da LEF, através de interpretação gramatical, a dívida ativa não tributária possui acepção ampla, podendo englobar créditos variados da Fazenda Pública provenientes da lei, do contrato ou de decisão judicial – que não se amoldem no conceito de dívida ativa tributária -, pelo explícito uso da expressão “demais créditos da Fazenda Pública”, seguido da locução “tais como”, enumerando, exemplificativamente, as hipóteses de dívida ativa não tributária, nas quais se inserem, com destaque: “multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias”, “indenizações” e “alcances dos responsáveis definitivamente julgados”.

Assim, verifica-se que a cobrança judicial dos créditos da Fazenda Pública, tributários ou não tributários, através da execução fiscal, possui grande abrangência.

Por outro lado, a satisfação das obrigações de pagar quantia reconhecidas em sentença se submete à fase de cumprimento de sentença – e não a um processo autônomo de execução -, em razão do sincretismo processual vigente no ordenamento jurídico pátrio desde o advento da Lei n. 11.232/2005.

Além disso, dispõe o CPC/2015, em seu art. 515, I, que a execução dos títulos executivos judiciais – entre os quais se inserem as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa – dar-se-á segundo a sua Parte Especial, Livro I, Título II.

A par dessas premissas, evidencia-se que o cabimento do cumprimento de sentença de obrigação de pagar quantia não exclui, por si só, a via processual da execução fiscal, facultando-se à pessoa jurídica de direito público credora a escolha do procedimento que melhor lhe aprouver, desde que, neste último (execução fiscal), inscreva o título executivo judicial líquido na dívida ativa, ensejando a emissão da respectiva e imprescindível CDA, a caracterizar os pressupostos da certeza, liquidez e exigibilidade.

Nesse sentido, impossibilitar a utilização da execução fiscal somente pela possibilidade de cobrança do crédito através do cumprimento de sentença caracterizaria negativa de vigência aos arts. 1º e 2º da LEF e 39, § 2º, da Lei n. 4.320/1964, que conferiram à dívida ativa não tributária vasto alcance.

Na hipótese, tratando-se de sentença condenatória ao pagamento de multa pela prática de ato de improbidade administrativa, há perfeita subsunção do crédito exequendo ao disposto no art. 39, § 2º, da Lei n. 4.320/1964, que insere no conceito de dívida ativa não tributária “multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias”, afigurando-se inquestionável a possibilidade de utilização, tanto do cumprimento de sentença, quanto da execução fiscal, para a cobrança dessa multa fixada em sentença, desde que atendidos os respectivos requisitos de cada procedimento executivo.

Em relação à legitimidade ativa para a referida execução, considerando o entendimento do Supremo Tribunal Federal em controle de constitucionalidade concentrado (ADIs n. 7.042 e n. 7.043), que deu interpretação conforme sem redução de texto ao art. 17 da Lei n. 8.429/1992 (com redação dada pela Lei n. 14.230/2021) – no sentido de que o ente público lesado possui legitimidade ativa (ordinária) para a ação de improbidade administrativa -, é de se reconhecer também a legitimidade ativa da Fazenda Pública interessada para a propositura da execução fiscal da multa fixada na sentença proveniente de ato de improbidade, sobretudo por ser a destinatária dos respectivos valores, não se aplicando o disposto no art. 13 da Lei n. 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública – LACP), segundo o qual tais montantes serão destinados a um fundo específico.

Processo relacionado: REsp 2.123.875-MG, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 1/4/2025, DJEN 4/4/2025.

Fonte: Superior Tribunal de JustiçaAutor: Informativo nº 847
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