TRE-RN afasta condenação de prefeito por propaganda eleitoral antecipada por postagens em redes sociais privada

A corte do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte (TRE-RN) acatou o recurso do prefeito de Natal, Álvaro Dias, em um processo de propaganda eleitoral antecipada. O colegiado reverteu a sentença da primeira instância, na qual o gestor municipal teria que pagar multa de R$ 5 mil.

O julgamento foi de acordo com o voto do relator, o juiz eleitoral Fernando Jales, que foi acompanhado pelo Desembargador Cláudio Santos, pela juíza eleitoral Adriana Magalhães e pelo voto do presidente do TRE, Desembargador Gilson Barbosa. Foram vencidos os votos dos juízes Carlos Wagner, Ricardo Tinoco e Geraldo Mota.

O processo

No dia 27 de julho de 2020, a juíza Hadja Rayanne Holanda de Alencar, da 3ª Zona Eleitoral de Natal, atendeu a um pedido de tutela de urgência da Procuradoria Regional Eleitoral (PRE) e determinou que o prefeito da capital potiguar interrompesse publicações em suas redes sociais pessoais das ações implantadas pela Prefeitura no combate ao novo coronavírus. A PRE apontou que as publicações eram propaganda eleitoral fora do prazo regulamentar.

Após a decisão liminar, a defesa de Álvaro Dias entrou com recurso da decisão, ainda em primeira instância. No entanto, a juíza eleitoral manteve a sentença. Desta vez, o recurso da defesa foi levado ao colegiado regional.

Na sustentação oral, o advogado do prefeito, Leonardo Palitot, reforçou as alegações presentes nos autos, onde afirmou que as postagens são uma prestação de contas e exposição dos atos de governo e disse “inexistir nas publicações, ainda que de forma subliminar, a vinculação do mérito das ações ao Prefeito”, apontando também não haver requisitos que caracterizem propaganda eleitoral.

Por fim, apontou Jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a qual entende que “a divulgação de atos parlamentares encontra abrigo no ordenamento eleitoral, decorre do dever constitucional de prestação de contas à população e, portanto, não se confunde com a propaganda eleitoral”.

O relator do processo na corte, o juiz Fernando Jales, acatou os argumentos da defesa. Ao acompanhar o colega de bancada, a juíza eleitoral Adriana Magalhães argumentou que “não é valido impor ao gestor a proibição de expor seus atos de gestão”.

Processo relacionado: 0600052-73.2020.6.20.0003

NOTA DO ESCRITÓRIO

Em acréscimo a matéria colacionamos a ementa do acórdão:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ANTECIPADA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. ATOS DE GESTÃO. AÇÕES DE ENFRENTAMENTO À PANDEMIA EM CURSO. DIVULGAÇÃO EM PERFIL PRIVADO DE REDE SOCIAL DO ATUAL PREFEITO E PRÉ-CANDIDATO À REELEIÇÃO. IRREGULARIDADE DA PUBLICIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO A ATO PROPAGANDÍSTICO VEDADO NO PERÍODO OFICIAL DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTO (AINDA QUE MEDIANTE USO DE TERMOS SEMANTICAMENTE EQUIVALENTES), OU, AINDA, ALUSÃO AO PLEITO VINDOURO. MANIFESTAÇÕES CONSENTÂNEAS COM O DEVER CONSTITUCIONAL DE PRESTAR CONTAS E COM AS LIBERDADES DE EXPRESSÃO E DE INFORMAÇÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO.
1 – Trata-se de recurso eleitoral contra sentença de procedência em representação por propaganda eleitoral antecipada, por meio da qual o pré-candidato reputado beneficiário (ora recorrente) foi condenado ao pagamento de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do § 3º do art. 36 da Lei das Eleições.
2 – A propaganda eleitoral se submete a plexo normativo orientado pelo vetor axiológico do equilíbrio da disputa política, que veda – dentre outras condutas – a prática precoce de ato propagandístico (realizado antes de encerrada a fase para registro de candidaturas), de cunho positivo ou negativo, em ordem a compatibilizar a liberdade de expressão dos atores do processo democrático com a igualdade de chances entre os pré-candidatos, sujeitando os responsáveis pela execução do ilícito e, quando comprovado o seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa individual no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), nos termos do art. 36, caput e § 3º, da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições).
3 – Com a edição da Lei nº 12.034/2009, que incluiu na Lei das Eleições o art. 36-A, o Legislador instituiu um verdadeiro núcleo de ressalvas à vedação da publicidade prematura, o qual, a partir da edição da Lei nº 13.165/2015, foi deveras alargado, dando ensejo ao que ficou conhecido como “atos de pré-campanha”. Cuida-se de rol exemplificativo de exposições presumidamente acessíveis ao pré-candidato médio e, portanto, compatíveis com a paridade de armas entre os candidatos, desde que não envolvam pedido explícito de voto (TSE, REspe 51-24/MG, rel. Min. Luiz Fux, DJe 18.10.2016).
4 – No caso vertente, tem-se que, na origem, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL (ora recorrido) ajuizou representação por propaganda eleitoral extemporânea em desfavor do ora recorrente ÁLVARO COSTA DIAS (atual prefeito de Natal/RN e pré-candidato à reeleição), imputando-lhe a prática de propaganda eleitoral antecipada, que, segundo posto na inicial, teria ocorrido mediante várias publicações, em redes sociais de uso particular do ora recorrente, de ações da Prefeitura desenvolvidas no contexto do combate à pandemia decorrente do coronavírus, em manifesta associação dos feitos administrativos à pessoa do gestor/pré-candidato. Após o devido contraditório, o juízo a quo entendeu caracterizada a publicidade irregular, invocando, como principal fundamento, a divulgação das postagens associada à conduta vedada prevista no inciso IV do art. 73 da Lei das Eleições.
5 – A despeito de amparo em primorosa argumentação, a conclusão do juízo a quo não merece prosperar. É que, do exame dos “prints” colacionados na petição inicial, dessume-se que a publicidade inquinada foi realizada em redes sociais da pessoa do prefeito, estando o conteúdo divulgado circunscrito às principais ações que este, na qualidade de gestor municipal, tem adotado no enfrentamento da pandemia decorrente do coronavírus, não havendo, em nenhuma das postagens, pedido explícito de voto (ainda que mediante uso de termos semanticamente equivalentes), ou, ainda, alusão ao pleito vindouro.
6 – Não é dado exigir do gestor público, apenas por ser pré-candidato à reeleição, que se abstenha por completo de comunicar à sociedade os atos de sua gestão, pois, conquanto ostente em razão do cargo uma posição de visibilidade/publicidade privilegiada, permanece sujeito ao dever constitucional de prestar contas e em pleno gozo das liberdades de expressão e de informação. De sorte que, também por isso, não constitui ato atentatório à isonomia de chances, em ordem a caracterizar propaganda eleitoral antecipada, a divulgação gratuita na internet de suas ações na condução da coisa pública, quando desacompanhada de pedido de voto ou alusão a pleito futuro, mercê do previsto no § 2º do art. 36-A da Lei nº 9.504/97, que permite o pedido de apoio político, a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver. Nesse sentido, confiram-se: TSE, REspe nº 41-60/PB, rel. Min. Luiz Fux, DJe 20.2.2018; TRE/RN, RP nº 0600135-69, rel. Juiz Francisco Glauber Pessoa Alves, DJe 30.7.2018; TRE/ES, RE nº 0600061-11, rel. Juiz Fernando César Baptista de Mattos, DJe 2.9.2020; TRE/RJ, RE nº 06000006-70, rel. Juiz Claudio Luís Braga Dell´Orto, DJe 7.8.2020; TRE/SE, RP nº 67-77, rel. Juiz Francisco Alves Junior, DJe 21.3.2017.
7 – De mais a mais, não merece ser sufragada a tese de que a publicidade teria restado maculada, em ordem a caracterizar a propaganda eleitoral extemporânea, uma vez que as ações divulgadas também encontrariam expressa vedação no inciso IV do art. 73 da Lei das Eleições. Isso porque o aludido comando proibitivo não se subsume ao conceito de ato de campanha vedado, constituindo – como bem se sabe – conduta vedada a agente público, o que, em tese, rende ensejo à apuração dos mesmos fatos aqui analisados também sob a ótica desse preceito legal e, eventualmente, sob o enfoque do abuso de poder.  
8 – Recurso a que se dá provimento. (TRE-RN – Proc. nº 0600052-73.2020.6.20.0003, Rel. Des. FERNANDO DE ARAUJO JALES COSTA, julgado em 17.09.2020, DJe de 28.09.2020)

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