TCE-MG responde consulta sobre o art. 8º da LC nº 173/2020 no que toca os concursos públicos

Trata-se de consulta formulada por presidente de Câmara Municipal, por meio da qual questiona sobre a possibilidade de realização de concurso público, antes de 31/12/2021, tendo em vista a publicação da Lei Complementar n. 173/20.

Admitida a consulta, o relator, conselheiro Cláudio Couto Terrão, salientou que a referida lei complementar estabeleceu uma série de medidas de auxílio financeiro da União para os estados, o Distrito Federal e os municípios, com a finalidade de mitigar os efeitos causados pela Covid-19 e, em contrapartida, por força do art. 8º, os entes federados afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia ficam proibidos de, até 31/12/21, realizar diversos atos que impliquem aumento de despesa.

Para responder adequadamente a dúvida do consulente, o relator fez uma interpretação de forma sistemática e teleológicadas proibições e hipóteses de exceção previstasnas regras contidas no art. 8º da Lei Complementar n. 173/20. Analisou, primeiramente, a vedação contida no inciso II, proibindo a criação de cargos, empregos e funções que impliquem aumento de despesa, continuando, no entanto, permitidas as readequações legais no quadro de pessoal que não resultem efetivo acréscimo de gastos públicos. Nesse sentido, observou ser plenamente possível a adoção de medidas em que haja, por exemplo, a extinção de cargos em comissão e a criação de cargos efetivos em substituição daqueles, sem que importem em aumento global de despesa, notadamente quando tais medidas decorrem do reconhecimento, administrativo ou judicial, de que as atribuições dos cargos em comissão não sejam compatíveis com a natureza desses cargos, mas de cargos efetivos.

O segundo dispositivo examinado, inciso IV do art. 8º, permite que os entes federados afetados pela pandemia da Covid-19 admitam ou contratem pessoal para: 1) reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa; 2) reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios: 3) contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal; 4) contratações de temporários para prestação de serviço militar; 5) contratações de alunos de órgãos de formação de militares. Nesse ponto, destacou que, conforme entendimento fixado pelo Tribunal Pleno na Consulta n. 1092376, as vedações contidas no art. 8º da Lei Complementar n. 173/20 estendem-se à administração indireta dos entes federados, devendo o comando do inciso em exame ser lido no sentido de abarcar, igualmente, os empregos efetivos.

Com base nessa interpretação, verificou que o inciso V, dispositivo que contém a norma cerne da consulta, deve ser compreendido ampliativamente – não se restringindo apenas aos cargos efetivos, mas alcançando também os empregos públicos efetivos – porquanto, ao excepcionar a proibição de realização de concurso público, autoriza a realização daqueles destinados às reposições de vacâncias previstas no inciso IV. Especificamente ao momento da ocorrência da vacância, se ela deve necessariamente ter ocorrido após a publicação da Lei Complementar n. 173/20, ou se o aspecto temporal é irrelevante para fins de reposição dos cargos e empregos efetivos vagos, reproduziu opinião da Unidade Técnica no sentido de que não havendo tais restrições no normativo, também não caberá ao intérprete fazê-las, assim, configurando-se a vacância no decorrer da situação de calamidade pública ou anterior a essa situação, será possível sua reposição.

Para o relator, a finalidade da norma consiste na contenção de gastos, prevenindo abusos e aumentos desproporcionais ou incompatíveis com a realidade atual, e não na paralisação da prestação dos serviços públicos essenciais. Assim, concluiu que, diante de demanda iminente, devem ser preservadas e até mesmo incentivadas as nomeações para ocupação de cargos efetivos ou empregos públicos, pois tais providências apresentam consonância com todo o ordenamento, devendo ser evitada a adoção de alternativas de contratação de pessoal, tais como o provimento de cargos temporários ou a contratação de terceirizados para o exercício das mesmas atribuições dos cargos efetivos. Ressaltou, ainda, que, se a lei complementar permite a criação de cargo, emprego ou função que não gere aumento de despesas, nenhuma razão haveria para impedir que eles sejam objeto de concurso público. Ponderou, no entanto, que a Administração deverá considerar a conveniência de realização de provas durante a pandemia, bem como as cautelas necessárias para tanto.

O conselheiro Durval Ângelo, após pedido de vista, em exame dos autos e estudo do tema objeto da presente consulta, acompanhou integralmente o voto do conselheiro Cláudio Couto Terrão. Os demais conselheiros também acompanharam o voto do relator e o Tribunal Pleno fixou prejulgamento de tese, com caráter normativo, nos seguintes termos:

1. os órgãos e entidades vinculados aos entes afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19, até 31 de dezembro de 2021:
1.1. poderão realizar concurso público para:
a) o provimento dos cargos efetivos e empregos públicos que não impliquem aumento global de despesas com pessoal;
b) a reposição dos cargos efetivos e empregos públicos, independentemente da data em que se deu a vacância, devendo o gestor motivar adequadamente o ato administrativo, demonstrando sua congruência com planejamento administrativo voltado à adoção da medida;
c) o provimento dos cargos efetivos e empregos públicos diante de necessidade urgente e devidamente comprovada, independentemente de resultar aumento de despesas com pessoal, sem prejuízo das contratações temporárias até a conclusão do certame;

1.2. poderão admitir ou contratar pessoal para:
a) prover os cargos, empregos e funções criados com base no permissivo contido no inciso II do art. 8º da Lei Complementar n. 173/20;
b) prover as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa;
c) prover as reposições de cargos efetivos e vitalícios ou de empregos públicos, independentemente do período em que se deu a vacância;
d) dar provimento originário a cargo público, devendo o gestor motivar adequadamente o ato de nomeação, em especial com a demonstração de sua congruência com a responsabilidade fiscal e o planejamento administrativo voltado à adoção da medida;
e) dar provimento aos cargos efetivos e empregos públicos diante de necessidade urgente e devidamente comprovada, independentemente de resultar aumento de despesa, ainda que tais contratações não se caracterizem como essencialmente temporárias;
f) prover as necessidades temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal;
g) prover os cargos temporários para prestação de serviço militar;
h) promover a admissão de alunos de órgãos de formação de militares;

2. os atos de admissão de pessoal deverão observar os demais balizamentos da própria Lei Complementar n. 173/20, da Lei Complementar n. 101/00, e da legislação eleitoral (em especial, o art. 73, inciso V, da Lei n. 9.504/97);

3. a Administração Pública deverá ainda avaliar a conveniência de realização das provas de concurso público durante a pandemia da Covid-19, bem como definir as cautelas sanitárias necessárias.

Consulta n. 1092248, Rel. Cons. Cláudio Couto Terrão, 18.11.2020.

Fonte: Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais Autor: Informativo de Jurisprudência nº 222
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