TSE defere registro de candidato mesmo com prestação de contas anual julgada irregular por déficit orçamentário

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, por maioria de votos, deferir o registro de candidatura de Marne Mateus Vitorino (PSDB) ao cargo de vereador do município de Mostardas (RS) nas Eleições 2020. A sessão foi conduzida pelo presidente em exercício, ministro Edson Fachin.

O caso

Vitorino havia apresentado recurso contra decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul (TRE-RS) que indeferiu o registro por ato doloso de improbidade administrativa, em razão de irregularidades insanáveis na prestação de contas públicas do exercício de 2012, época em que era prefeito da cidade.

O relator, ministro Sérgio Banhos, já havia votado no sentido de manter a decisão do Regional e negar o registro por entender que a irregularidade na prestação de contas, em decorrência do déficit orçamentário resultante de despesas realizadas nos dois últimos quadrimestres de 2012, violou a Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, de acordo com o relator, houve “agravamento da situação financeira do município e a insuficiência financeira no encerramento do exercício importaria em mais de R$ 401 mil, evidenciando-se o dolo do gestor”.

Voto-vista e divergência

Na sessão de hoje, o ministro Mauro Campbell Marques apresentou o voto-vista e abriu divergência ao afirmar que “não estão presentes elementos que revelem a existência de ato doloso de improbidade administrativa aptos a atrair a incidência da inelegibilidade da alínea ‘g’ do inciso 1º, artigo 1º, da Lei Complementar 64/90”.

Campbell Marques reconheceu que houve “inércia do gestor em reduzir o déficit público, apesar do alerta emitido pela corte de contas”, mas reiterou que deve prevalecer o direito fundamental à elegibilidade.

A divergência foi seguida pelos ministros Carlos Horbach, Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Benedito Gonçalves. Ficaram vencidos o relator e o ministro Edson Fachin.

Processo relacionado: Respe 0600190-44

NOTA DO ESCRITÓRIO

Em acréscimo a matéria colacionamos a ementa do acórdão:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVOS INTERNOS EM RECURSO ESPECIAL. RRC. PREFEITO. ACÓRDÃO REGIONAL QUE REFORMOU A SENTENÇA PARA RECONHECER A CAUSA DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/1990 E INDEFERIR O REGISTRO. PRESENÇA CUMULATIVA DOS REQUISITOS EXIGIDOS PARA A INCIDÊNCIA DA HIPÓTESE DE INELEGIBILIDADE. NÃO VERIFICADA. A MERA EXISTÊNCIA DE DÉFICIT ORÇAMENTÁRIO NÃO É SUFICIENTE PARA QUE SE COMPREENDA PELA MÁ–FÉ DO ADMINISTRADOR PÚBLICO. PRECEDENTES. DECISÃO AGRAVADA. PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL PARA DEFERIR O REGISTRO DE CANDIDATURA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. NEGADO PROVIMENTO AOS AGRAVOS INTERNOS.
1. Na origem, o TRE/RS reformou a sentença para indeferir o requerimento de registro de candidatura do prefeito eleito de Capão da Canoa/RS, ante a incidência da hipótese de inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990, resultante da rejeição das contas de gestão, referentes ao exercício de 2012, pelo descumprimento do disposto nos arts. 1º, § 1º, e 42 da LC nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).
2. A violação dos dispositivos da LRF está consubstanciada na situação de insuficiência financeira, na ordem de R$ 980.538,97, no encerramento do mandato de prefeito, em 2012, e na aquisição de cestas natalinas, por meio de notas de empenho, nos últimos quadrimestres do mandato.
3. Está correta a decisão agravada, por meio da qual se reformou o acórdão regional para deferir o registro de candidatura ante a compreensão de que não se verifica, na espécie, a presença cumulativa de todos os requisitos necessários para a incidência da causa de inelegibilidade da alínea g, ante a ausência de elementos suficientes para atestar a configuração de ato doloso de improbidade administrativa, tendo–se salientado, ainda, que a mera existência de déficit orçamentário não é suficiente para que se compreenda pela má–fé do administrador público. Precedente: REspE nº 115–67/RJ, rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS de 19.12.2016.
4. Cabe a esta Justiça especializada aferir a presença de elementos que indiquem má–fé, desvio de recursos públicos em benefício próprio ou de terceiros, dano ao erário, reconhecimento de nota de improbidade, grave violação a princípios, entre outros, entendidos assim como condutas que, de fato, lesem, dolosamente, o patrimônio público ou prejudiquem a gestão da coisa pública, conforme o entendimento desta Corte (RO nº 1067–11/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, PSESS de 30.9.2014).
5. No caso concreto, as premissas e os fundamentos registrados pelo acórdão regional não são suficientes para atestar, indene de dúvidas, a existência de irregularidade insanável resultante de ato doloso de improbidade administrativa e, por conseguinte, a presença cumulativa dos requisitos exigidos para a restrição do jus honorum pela incidência do art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990.
6. Deve ser mantida a decisão agravada ante a inexistência de argumentos aptos a modificá–la.
7. Negado provimento aos agravos internos. (TSE – RESPE nº 060031962, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 01.07.2021, DJE de 06.08.2021)

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