TCE-MT aponta que gestores podem aumentar despesas com profissionais da educação, inclusive, com abono (rateio) para atingir os 70% do FUNDEB

Diante das dificuldades no cumprimento da fração mínima de 70% do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) para valorização e remuneração dos profissionais da educação básica em 2021, o Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT) apontou que o administrador público pode adotar as medidas que melhor acomodem o cumprimento do percentual mínimo, a exemplo do pagamento de indenizações e concessão de adicionais decorrentes de direitos adquiridos.

O posicionamento responde a resolução de consulta proposta pela Câmara Municipal de Guarantã do Norte e Prefeitura de Nova Nazaré, com o objetivo de verificar a possibilidade de aumento de despesa com profissionais da educação, inclusive por meio de abono salarial, frente à proibição estabelecida na Lei Complementar n° 173/2020 (ART. 8º, INCISO I). Sob relatoria do conselheiro Valter Albano, o processo foi apreciado durante a sessão ordinária remota desta terça-feira (14).

Na ocasião, o relator chamou a atenção para o fato de que a concessão de reajuste para atendimento ao piso salarial nacional dos profissionais da educação básica, enquadra-se na hipótese excepcional de determinação legal anterior à calamidade, tratando-se de um direito resguardado decorrente da Lei 11.738/2008.

Assim, reforçou que o descumprimento do mínimo constitucional na valorização destes profissionais em 2021, diante da comprovação de que o gestor adotou medidas para evitar tal situação, deve ser ponderado pelo TCE-MT. “Para isso, devem ser considerados os princípios da supremacia do interesse público, da razoabilidade e da proporcionalidade, além  das dificuldades reais do gestor, conforme art. 22, caput, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”, disse.

Ou seja, para conferir a efetiva aplicabilidade da norma constitucional é possível o pagamento de abono ao setor em efetivo exercício, em caráter provisório e excepcional. “Isso, quando a medida tiver o objetivo de assegurar aos referidos profissionais a percepção de, no mínimo, 70% dos recursos anuais do novo Fundeb, necessitando de lei  específica, que deve dispor sobre o seu valor, forma de pagamento e critério de partilha”, explicou.

De acordo com Valter Albano, é possível outras formas de reajustes para a categoria de profissionais da educação básica que ultrapassem o piso nacional, sendo imprescindível, para a não incidência das vedações da LC 173/2020, que eventuais medidas que aumentem a despesa com pessoal sejam adotadas exclusivamente com o objetivo de atender ao disposto no art.212-A, XI, da Constituição da República.

Deste modo, acolheu parcialmente os pareceres da Secretaria Geral de Controle Externo (Segecex) e do Ministério Público de Contas (MPC) ao emitir seu voto, que foi acompanhado por unanimidade pelo Pleno. “O não atingimento do mínimo constitucional na valorização e remuneração dos profissionais da educação básica deverá ser justificado e comprovado pelo gestor no momento da prestação de contas a este Tribunal de Contas”, concluiu.

NOTA DO ESCRITÓRIO

Em acréscimo a matéria colacionamos a ementa da consulta:

CÂMARA MUNICIPAL DE GUARANTÃ DO NORTE. PREFEITURA MUNICIPAL DE NOVA NAZARÉ. CONSULTA. EDUCAÇÃO. REMUNERAÇÃO. FUNDEB. 70% PARA PAGAMENTO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA EM EFETIVO EXERCÍCIO. DETERMINAÇÃO CONSTITUCIONAL (ART. 212-A, XI, CF/1988). SUPREMACIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS SOBRE AS INFRACONSTITUCIONAIS (LC 173/2020 E LEI 14.113/2020). POSSIBILIDADE DE AUMENTO DE DESPESAS COM PESSOAL EXCLUSIVAMENTE PARA ESSES PROFISSIONAIS. INCREMENTO DE DESPESAS E ABONOS. POSSIBILIDADE INDEPENDENTE DE NORMA ANTERIOR AO PERÍODO DE CALAMIDADE PÚBLICA E DE SENTENÇA JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO.
1) As vedações impostas pela LC 173/2020, não podem se sobrepor à determinação constitucional de aplicação mínima de 70% dos recursos do Fundeb na valorização e remuneração dos profissionais da educação básica.
2) É possível o aumento de despesas com pessoal, durante o período de vedação da LC 173/2020, exclusivamente para contemplar os profissionais da educação básica em efetivo exercício, conforme prevê o artigo 212-A, da Constituição Federal, acrescido pela EC 108/2020, em razão do princípio da Supremacia da Norma Constitucional, desde que observados os limites e controles para a criação e aumento da despesa com pessoal previstos no ordenamento jurídico.
3) As vedações do art. 8º da Lei Complementar 173/20 não podem obstar a obrigação constitucional de aplicação dos 70% dos recursos do Fundeb em remunerações dos profissionais da educação básica, ainda que, para atingi-lo, seja necessário, conceder reajuste ou revisão de remuneração, conceder ou majorar abonos salariais ou 14º salário, conceder progressão ou promoção funcional, ou alterar a estrutura de carreira que implique aumento de despesa no período compreendido entre 28/05/20 e 31/12/21.
4) A concessão de reajuste para atendimento ao piso salarial nacional dos profissionais da educação básica, enquadra-se na hipótese excepcional de determinação legal anterior à calamidade, tratando-se de um direito resguardado decorrente da Lei 11.738/2008.
5) É possível outras formas de reajustes para a categoria de profissionais da educação básica que ultrapassem o piso nacional, sendo imprescindível, para a não incidência das vedações da LC 173/2020, que eventuais medidas que aumentem a despesa com pessoal sejam adotadas exclusivamente com o objetivo de atender ao disposto no art. 212-A, XI, da Constituição da República.
6) Para conferir efetiva aplicabilidade da norma constitucional é possível o pagamento de abono aos profissionais da educação básica em efetivo exercício, em caráter provisório e excepcional, quando a medida tiver o objetivo de assegurar aos referidos profissionais a percepção de, no mínimo, 70% dos recursos anuais do Novo Fundeb, necessitando de lei autorizativa específica, que deve dispor sobre o seu valor, forma de pagamento e critério de partilha.
7)
 Diante das dificuldades de cumprir com a fração mínima de 70% do Fundeb para valorização e remuneração dos profissionais da educação básica em 2021, o administrador público deve adotar medidas que melhor acomodem o cumprimento do percentual mínimo, a exemplo do pagamento de indenizações e concessão de adicionais decorrentes de direitos adquiridos.
8) O descumprimento do mínimo constitucional de aplicação dos 70% Fundeb na valorização dos profissionais da educação básica no exercício de 2021, diante da comprovação de que o gestor público adotou medidas para evitar tal situação, deve ser ponderado pelo Tribunal de Contas com base nos princípios da supremacia do interesse público, da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando os obstáculos e as dificuldades reais do gestor, conforme determinação do art. 22, caput, da LINDB.
9) O não atingimento do mínimo constitucional na valorização e remuneração dos profissionais da educação básica deverá ser justificado e comprovado pelo gestor no momento da prestação de contas a este Tribunal de Contas. (TCE-MT – Procs. nºs 59.870-4/2021 e 71.554-1/2021 (Decisão nº 18/2021), Rel. Cons. VALTER ALBANO, julgado em 14.12.2021, publicado em 16.12.2021)
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