Profissionais do magistério podem ter progressão ainda que tenham sido utilizados 100% dos recursos do FUNDEB, entende TCE-PR

É possível que um município conceda progressões horizontais e verticais aos profissionais do magistério, ainda que tenham sido utilizados 100% dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) para custear a folha de pagamento dos profissionais da educação, mesmo que lei local vede progressões nesse caso.

Isso porque, mesmo que um município tenha estabelecido critérios mais rigorosos de gasto com pessoal do que os fixados pela Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF), eles não podem ser utilizados para impedir o direito subjetivo do servidor público que preencha todos os requisitos legais para a progressão funcional, mas apenas para nortear a gestão municipal no planejamento e na execução orçamentária.

Essa é a orientação do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo Município de Formosa do Oeste, sobre a possibilidade de conceder progressões vertical e horizontal aos profissionais do magistério do município, mesmo que a folha de pagamento desses servidores tenha alcançado 100% dos recursos do Fundeb e lei local vede a concessão nesse caso.

Instrução do processo

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) afirmou que não há impedimento para que lei municipal imponha limites mais restritivos de controle das despesas públicas do que os preceituados pela LRF. Mas destacou que não seria possível restringir o direito adquirido do servidor público que preenche todos os requisitos para a progressão funcional, com base em aspectos orçamentários.

Legislação

O Fundeb é um fundo especial de natureza contábil dos estados, composto por recursos provenientes de impostos e das transferências dos estados, Distrito Federal e municípios vinculados à educação, conforme disposto nos artigos 212 e 212-A da Constituição Federal.

O Fundeb foi instituído como instrumento permanente de financiamento da educação pública por meio da Emenda Constitucional n° 108/20 e é regulamentado pela Lei nº 14.113/20.

O artigo 212 da Constituição Federal (CF/88) dispõe que a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18%, e os estados, o Distrito Federal e os municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

O artigo 212-A da CF/88 estabelece que os estados, o Distrito Federal e os municípios destinarão parte dos recursos da educação à manutenção e ao desenvolvimento do ensino na educação básica e à remuneração condigna de seus profissionais. O artigo 213 do texto constitucional fixa que os recursos públicos serão destinados às escolas públicas.

O artigo 25 da Lei nº 14.113/20 estabelece que os recursos dos fundos, inclusive aqueles oriundos de complementação da União, serão utilizados pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios no exercício financeiro em que lhes forem creditados, em ações consideradas de manutenção e de desenvolvimento do ensino para a educação básica pública.

O artigo 26 dessa lei federal expressa que, excluídos os recursos de atendimento e de melhoria da aprendizagem com redução das desigualdades em redes públicas, proporção não inferior a 70% dos recursos anuais totais do Fundeb será destinada ao pagamento, em cada rede de ensino, da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício.

A LRF estabelece (artigo 20, III, “a” e “b”) o limite de 54% da receita corrente líquida (RCL) para os gastos com pessoal do Poder Executivo municipal; e que a verificação do cumprimento do limite será realizada ao final de cada quadrimestre.

Para o município que ultrapassa 95% do limite, é vedado (parágrafo único do artigo 22 da LRF): concessão de vantagens, aumentos, reajuste ou adequações de remuneração a qualquer título; criação de cargo, emprego ou função; alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa; provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal, ressalvada reposição de aposentadoria ou falecimento de servidores nas áreas de educação, saúde e segurança; e contratação de hora extra, ressalvadas exceções constitucionais.

Nos municípios onde ocorre a extrapolação do limite, a Constituição Federal estabelece (parágrafos 3º e 4º do artigo 169) que o poder Executivo deverá reduzir em, pelo menos, 20% os gastos com comissionados e funções de confiança. Caso não seja suficiente para voltar ao limite, o município deverá exonerar os servidores não estáveis. Se, ainda assim, persistir a extrapolação, servidores estáveis deverão ser exonerados. Neste caso, o gestor terá dois quadrimestres para eliminar o excedente, sendo um terço no primeiro, adotando as medidas constitucionais.

Caso o excedente não seja eliminado no prazo legal, o município não poderá (parágrafo 3º do artigo 23 da LRF), enquanto durar o excesso, receber transferências voluntárias; obter garantia, direta ou indireta, de outro ente; e nem contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal.

O Supremo Tribunal Federal (STF), na ADI nº 4426/CE, decidiu que não há óbice para que o município estabeleça critérios mais rigorosos de gasto com pessoal do que o estabelecido na LRF.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Tema Repetitivo nº 1075, fixou a tese de que é ilegal o ato de não concessão de progressão funcional de servidor público, quando atendidos todos os requisitos legais, a despeito de superados os limites orçamentários previstos na LRF, referentes a gastos com pessoal de ente público, tendo em vista que a progressão é direito subjetivo do servidor público, decorrente de determinação legal, estando compreendida na exceção prevista no inciso I do parágrafo único do artigo 22 da Lei Complementar nº 101/00.

Decisão

O relator do processo, conselheiro Maurício Requião, afirmou que os parâmetros de indisponibilidade orçamentária-financeira estabelecidos pela lei complementar municipal não podem ser utilizados para tolher o direito subjetivo do servidor público, mas tão somente para nortear o ente público na gestão das despesas.

Requião ressaltou que, se a lei municipal dispõe que o professor fará jus à progressão horizontal ou vertical, na hipótese de cumprir os requisitos preceituados pela norma, não seria possível afastar o direito subjetivo do servidor que preenche os requisitos para progressão, em razão de o percentual da folha de pagamento dos profissionais do magistério ultrapassar 85% do Fundeb, ou na hipótese de a folha geral de pagamento alcançar o 51% da receita corrente líquida do município.

O conselheiro lembrou que no inciso I do artigo 22 da LRF está expressa a impossibilidade de vedação à concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação quando eles decorrerem de determinação legal.

Os conselheiros aprovaram o posicionamento do relator por voto de desempate do presidente, conselheiro Fernando Guimarães, na Sessão de Plenário Virtual nº 7/23 do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 27 de abril. O Acórdão nº 964/23 – Tribunal Pleno foi disponibilizado em 8 de maio, na edição nº 2.974 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC). O trânsito em julgado da decisão ocorreu em 17 de maio.

Serviço

Processo : 432929/21
Acórdão nº 964/23 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Formosa do Oeste
Relator: Conselheiro Maurício Requião de Mello e Silva

 

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