A Lei nº 14.276, de 27 de dezembro de 2021, promoveu, no final do ano, diversas modificações na Lei nº 14.113/2021 (novo FUNDEB). Dentre elas, nos deteremos ao ponto que tem gerado muita insegurança nos gestores quanto a definição dos profissionais da educação básica.
De fato, a Lei nº 14.113/2020, ao invés de ser mais objetiva na conceituação, fez mera referência a dispositivo da LDB que, por sua vez, também não são muito claros, ao contrário do que prescrevia o inciso II, do parágrafo único, do art. 22, da Lei nº 11.494/2007 (antigo FUNDEB).
Ocorre que a Lei nº 14.276/2021, deu nova redação ao inciso II, do § 1º, do art. 26, da Lei nº 14.113/2021, conforme tabela abaixo:
Lei nº 14.113/2020 |
Lei nº 14.276/2021 (nova redação) |
II – profissionais da educação básica: aqueles definidos nos termos do art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, bem como aqueles profissionais referidos no art. 1º da Lei nº 13.935, de 11 de dezembro de 2019, em efetivo exercício nas redes escolares de educação básica;
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II – profissionais da educação básica: docentes, profissionais no exercício de funções de suporte pedagógico direto à docência, de direção ou administração escolar, planejamento, inspeção, supervisão, orientação educacional, coordenação e assessoramento pedagógico, e profissionais de funções de apoio técnico, administrativo ou operacional, em efetivo exercício nas redes de ensino de educação básica; |
Percebe-se a Lei nº 14.276/2021 procurou inserir num único dispositivo a previsões contidas nos incisos I, II e III, do art. 61, da Lei nº 9.394/1996 (LDB), ao passo que parece ter excluído os profissionais dos incisos IV e V, que ainda dependiam de regulamentação do Conselho Nacional de Educação e do Conselho Estadual de Educação (§§ 7º e 8º, do art. 36, da LDB).
Sucede agora que com a inclusão dos profissionais de funções de apoio técnico, administrativo ou operacional, pensamos que o conceito de profissionais da educação básica ampliou mais ainda, visto que sequer é mais necessário formação como exige o disposto no art. 61, da LDB. Dessa forma, estão contemplados agora, por exemplo, merendeiras, porteiros, zeladores, respaldando com mais força os que já estavam tais como auxiliares de serviços gerais, auxiliar de administração, secretário da escola, agente de vigilância, bem como bibliotecário, nutricionista, desde que lotados e em efetivo exercício na rede de ensino da educação básica.
Digno de nota é o fato de que a Emenda nº 2 do Senado Federal tinha incluído a expressão nas escolas na parte final do inciso II, do § 1º, do art. 26, da Lei nº 14.113/2020, mas foi rejeitado pela Câmara dos Deputados. Essa modificação pretendia obrigatoriedade de que os profissionais estejam nas escolas, passando a ser inadmitidos os que estejam nas redes, mas não nas escolas. – por exemplo, aqueles em funções na secretaria de educação, mas não passou.
Na esteira, inobstante o posicionamento favorável dos Tribunais de Contas (TCE/PE, TCE/MG, TCE/MT e TCE/TO) quanto a aplicação do abono (rateio) para fins de atingimento dos 70% do FUNDEB, o legislador federal, ciente dessa dificuldade, mormente no ano inicial (2021) do novo FUNDEB e os reflexos da pandemia do coronavírus, achou por bem ser expresso nessa autorização:
§ 2º Os recursos oriundos do Fundeb, para atingir o mínimo de 70% (setenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos destinados ao pagamento, em cada rede de ensino, da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício, poderão ser aplicados para reajuste salarial sob a forma de bonificação, abono, aumento de salário, atualização ou correção salarial. (Incluído pela Lei nº 14.276, de 2021)
Por outro lado, transferiu do FUNDEB 70 para o FUNDEB 30 o custeio dos profissionais da área de psicologia ou de serviço social, desde que integrantes de equipes multiprofissionais que atendam aos educandos. Vejamos:
Art. 26-A. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão remunerar, com a parcela dos 30% (trinta por cento) não subvinculada aos profissionais da educação referidos no inciso II do § 1º do art. 26 desta Lei, os portadores de diploma de curso superior na área de psicologia ou de serviço social, desde que integrantes de equipes multiprofissionais que atendam aos educandos, nos termos da Lei nº 13.935 de 11 de dezembro de 2019, observado o disposto no caput do art. 27 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.276, de 2021)
Sobre o art. 26-A decisiva foi a Nota de 4 de novembro de 2021 da Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação (CNTE), durante a tramitação do PL nº 3418/2021, na Câmara dos Deputados, que assim se manifestou:
“E a remuneração de psicólogos e assistentes sociais na Lei 14.113 – embora sejam profissionais que contribuam com trabalhos intersetoriais nas escolas – não pode ocorrer através do Fundeb, por duas razões: i) esses profissionais não integram o rol legislativo dos profissionais da educação, discriminado no art. 61 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; e ii) a EC 108 é silente em relação a inclusão desses profissionais no cômputo do Fundo contábil. A Lei 13.935, que dispõe sobre a regulamentação de parte das atribuições de psicólogos e profissionais do serviço social, não os qualificou como profissionais da educação, tendo apenas considerado a prestação do trabalho desses profissionais nas redes públicas de educação básica, à luz das “necessidades e prioridades definidas pelas políticas de educação, por meio de equipes multiprofissionais”. E isso deixa claro o caráter de intersetorialidade e a distinção entre profissionais da educação, psicólogos e assistentes sociais. Ademais, essa legislação mantém coerência com o art. 71, IV da LDB, que proíbe expressamente a remuneração de psicólogos e assistentes sociais com recursos de manutenção e desenvolvimento do ensino”.
Por fim, como a Lei nº 14.276/2021, prevê sua vigência a partir da data da sua publicação, nem teve regra de transição, seus efeitos não retroagirão.
Ademais, difícil entender que profissionais que até então não estavam inseridos/autorizados a receberem pelo FUNDEB 70, durante todo o exercício de 2021, venham agora (entre 28 a 31 de dezembro) participarem do rateio, mormente o mês de referência fixado em lei municipal, sem esquecer dos abonos que já foram pagos antes da aludida lei e não mais existir sobras. Da mesma forma, não há qualquer irregularidade nos pagamentos ocorridos até 27.12.2021, pelo FUNDEB 70, dos profissionais de psicologia e serviços social. Enfim, eis uma situação típica do art. 22, da LINDB, em pleno final de exercício financeiro.
Por Josembergues Melo
ATUALIZAÇÃO 29.12.2021
Em complemento ao nosso artigo, trazemos trecho da Nota Pública da CNTE:
“Sobre a vigência da Lei 14.276, a CNTE entende o seguinte: i) o art. 2º tornou a norma vigente a partir de 27.12.2021, com uma única referência a efeitos retroativos, disposta no art. 53. Nenhum outro dispositivo conta com autorização parlamentar para aplicação pretérita; e ii) a Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei 4657/1942), em seu art. 6º, resguarda os atos jurídicos perfeitos da lei anterior.
Quanto aos profissionais detentores do direito ao rateio – e para evitar contabilidade criativa com os recursos do FUNDEB já executados e auditados pelos órgãos de controle e pelos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social –, a CNTE defende a destinação proporcional dos recursos entre os profissionais da educação reconhecidos pelo art. 61 da LDB (redação originária da Lei 14.113) até 26.12.2021, podendo, a partir desta data, serem contabilizados os demais profissionais que até então não integravam a subvinculação. Esse mecanismo abrange também psicólogos e assistentes sociais, que até então integravam a subvinculação do FUNDEB e que agora estão na rubrica dos 30% do Fundo.”
Apenas alertamos que a Nota se equivoca quanto a data 26.12.2021, na verdade, entendemos que é até 27.12.2021 já que a Lei nº 14.276, foi publicada em 28.12.2021.